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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4189 Data: 15 de
Maio de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA NO DIA DAS MÃES
2ª PARTE
Jonas Vieira pediu pausa para meditação
e foi lida uma crônica sobre o Dia das Mães. Depois, ele aludiu à última
crônica, sobre a frase “O que é sólido se desmancha no ar”, com elucubrações
marxistas, que ficou nebulosa no seu final e que, por isso, não foi entendida
pelos ouvintes.
Feita a emenda, entrou o reclame do
programa das bandas, às 11 horas da noite e logo me recordei da “Lyra do
Xopotó”, da Rádio Nacional, que meu pai não perdia e eu, na carona, escutava.
Em seguida, outro anúncio, “A voz da periferia”, à uma hora da tarde. “É para o
maternal do trabalho do Dieckmann, estou fora” - disse comigo mesmo.
E a escolha musical da Branca foi feita
antes da pausa para meditação? - imagino as reclamações.
Resolvido o problema de som no meu
computador nesse trecho do programa, detenhamo-nos nesse pedido. Tratava-se
nada mais nada menos que Cole Porter, que não só compunha como escrevia as
letras. E a música que a Branca solicitou é considerado um dos momentos mais
elevados da sua inspiração: “Anything Goes”.
Branca falou da peça que entrou em
cartaz na Broadway, pela primeira vez, em 1934 e que, além de ser uma contribuição
para o American Songmusic,
recebeu duas versões cinematográficas. Em seguida, fez uma rápida
resenha do musical; um rapazote pobre que estava num transatlântico que fazia a
travessia New York- Londres, que conhece e se apaixona uma herdeira que estava
noiva de um lorde. Enfatizou ainda que, nesse musical, estreou a Ethel Merman.
-E a gravação? - perguntaram.
-A gravação é com a Patti LuPone.
Depois falo sobre ela.
Jonas Vieira lhe deu o sinal verde para
falar antes de a música ir ao ar e a Branca prosseguiu:
Patti LuPone é fantástica, porque não
era só cantora, também era atriz. Ela fez “Evita”, “Os Miseráveis”. Em 1983,
recebeu o Tony Awards.
O entusiasmo da Branca tinha razão de
ser, era a conclusão nossa a cada nota do “Anything Goes” que soava.
O titular do Rádio Memória tinha todo o
direito de escolher, pelo menos, uma música e o fez; antes, preparou o espírito
dos ouvintes.
-Os tempos de hoje são bicudos. Nos
anos 40, 50, era tudo romântico, principalmente o cinema. Até os filmes de
guerra eram românticos.”
Houve um aparte do Dieckmann sobre um
filme de 1958 do Festival de Cinema Francês e foi dita a música que iria ao ar:
“Sempre no meu coração”, de Ernesto Lecuona, versão de Mauro Mendes, na
interpretação arrebatadora (adjetivo preferido do Dieckmann) do Orlando Silva.
Caramba, às primeiras notas que
chegaram ao meu ouvido, o filme, de 1942, logo entrou em cartaz na minha
cabeça. Apesar de eu não o ter assistido na tela do cinema, que causa uma
empatia maior com a plateia e sim, na telinha da televisão, fiquei
maravilhado. Todos os problemas do
mundo, por piores que fossem e os da fita eram familiares, seriam resolvidos
com essa belíssima criação do Ernesto Lecuona, foi o sentimento que tive
durante semanas.
A opção retornou ao Fernando Borer, que
preferiu “Day by day”, de Axel Stordahl, Paul Weston e letra de Sammy Cohn, a
gravação era com o trio Los Panchos e Eydie Gormé. Ilustrou seu pedido dizendo que a gravadora
se encontrava em dificuldades financeiras e, por economia, juntou a cantora com
o trio, o que redundou em extraordinário sucesso. E disse mais: “Day by day”
foi o sufixo de um programa muito demandado da Rádio Tamoio, “Músicas na
Passarela”.
-Grande Rádio Tamoio. - exclamou o Dieckmann,
prenhe de saudosismo.
No momento de identificar o locutor de
Músicas na Passarela, Fernando Borer se tornou dubitativo. Ora, ninguém melhor
do que o nosso amigo Luca para falar desse locutor, pois Humberto Reis quase se
tornou seu cunhado. Foi ele, segundo o Luca, que o introduziu na poesia de Rainer
Maria Rilke. Radialista de bom gosto, ainda com a palavra o Luca, informou,
certa vez, que o “Coração de Luto”, de Teixeirinha foi o disco mais vendido do
ano, mas que não o tocaria no seu programa.
Humberto Reis se tornou mais popular
como jurado do Flávio Cavalcanti, na TV Tupi, em que teve de fazer “tipo”.
Lembro-me dele na Rádio Nacional
enaltecendo, por inúmeras vezes, a voz do Tony Bennett e como intermediário de
perguntas de cultura geral dos ouvintes dessa emissora para o enciclopédico
Vieira de Mello.
Na vez da Branca, ela só disse uma
palavra:
-Surpresa.
Então, uma voz feminina, que se tornou
mais sensual por causa da língua francesa, convergiu a atenção de todos.
-Não é uma Barbra Streisand, mas
agrada. - disse comigo mesmo.
E a Branca matou a nossa curiosidade,
pelo menos, a minha: era Brigitte Bardot.
-A música, de 1963, celebra a
propriedade de Brigitte Bardot em Saint Tropez , “La Madrague ”. – prosseguiu,
com palavras parecidas com estas, que aqui reproduzo.
Fiquei tão interessado, pois Brigitte
Bardot estrelou o único filme proibido para menores de 18 anos a que não
consegui assistir no Cine Cachambi, e acionei o Departamento de Pesquisas do
Biscoito Molhado.
Ela filmara, em 1962, com Marcelo
Mastroiani, sob a direção de Louis Malle, a película “Vida Privada”, que, até
certo ponto, era a sua existência de prisioneira da celebridade. Retirou-se, em
seguida, para Saint Tropez, onde se estabeleceu na mansão chamada “La Madrague ”, que deu samba,
ou melhor, canção.
Mas lá ficou por pouco tempo, retornou
a Paris e, em 1963, atuou no filme de Jean-Luc Godard, “O Desprezo”.
Dieckmann, sem a concisão da Branca,
falou que era o dia das surpresas, além de ser das mães e citou o nome do seu
pedido: “Flying Home”.
Ótima pedida. Solos de vibrafone e
clarinete com swing não deixavam ninguém indiferente. Após uns quatro minutos,
chegou o momento de o nosso amigo apresentar mais informações sobre a sua
surpresa com palavras que tento aqui reproduzir.
-Lionel Hampton, membro da banda de
Benny Goodman, tinha pavor de avião, então seus amigos colocaram em música o
momento dele subindo os degraus de um avião. (*)
Coisa de gente com talento, que
transforma algo banal em uma obra de arte. Caso do André Victor Correia, por
exemplo, que, por ter ido a uma baile em que sofreu com um calçado
apertadíssimo, compôs o choro imortal, “André de Sapato Novo.”
Sobre “Flying Home”, Dieckmann nos
inteirou que a composição é de Benny Goodman, Eddie De Lange e do próprio
Lionel Hampton, o primeiro vibrafonista da história do Jazz.
Coube
ao doutor Fernando Borer, além de iniciar o programa, encerrá-lo. A sua escolha
recaiu sobre uma música que quase todos os grandes cantores gravaram, “Autumn
Leaves”. Assim como uma programa de jazz da Rádio MEC foi todo dedicado às
gravações de “Stardust”, poder-se-ia fazer o mesmo com “Autumn Leaves”.
O convidado do Jonas Vieira disse que a
sua origem é francesa, de 1945, com o nome “Les Feuilles Mortes”, composta pelo
franco-húngaro Joseph Kosma, com letra de Jacques Prévert. Yves Montand a apresentou ao público no filme
“Les Portes de la Nuit ”.
Veio, depois, a versão inglesa, “Autumn
Leaves”, que, em 1950, foi gravada pela Edith Piaf, que também o fez no
original.
Apesar de todo o encantamento que
“Autumn Leaves” traz, principalmente na voz do Nat King Cole - a gravação
escolhida – não posso deixar de me lembrar do filme de 1956, dirigida por
Robert Aldrich. Talvez porque tivesse
medo de ficar maluco, fiquei assustadíssimo com a cena do eletrochoque, além de
me decepcionar com o Lorne Greene de “Bonanza”, no papel de um vilão.
Mas voltemos ao “Autumn Leaves” com o
Nat King Cole. Fernando Borer citou o LP
lançado em 1957, “Love is the Thing” (O Amor é Importante), mas, pelas nossas
pesquisas, essa gravação aparece na faixa 5 do lado A do Long Playing “Sings
for Two”, com créditos para Joseph Kosma, Jacques Prevert, Johnny Mercer e
arranjos de Nelson Riddle.
Bem, importa mais a excelência da
música.
Jonas Vieira, com intervenções do
Dieckmann e da Branca, encerrou o programa sem deixar de aludir às férias do
Sérgio Fortes nas “Oropas”.
Bem, Rádio Memória cumpriu inteiramente
a sua missão nesse domingo; em uma hora, serviram-me várias os bolos Madeleines
proustianos.
(*) Lionel
Hampton merece uma linha a mais. Ele realmente se tornou membro da banda do
Benny Goodman, antes de fazer a sua própria, mas o que interessa é o seguinte:
o nosso Lionel tinha um vagão ferroviário de beira de estrada, onde mantinha
uma lanchonete e vivia. Um dia, um Benny Goodman faminto parou ali com amigos e
pediram os hambúrgueres de praxe, no que foram plenamente atendidos pelo balconista
Lionel, preparados pelo cozinheiro Lionel e servidos na mesinha pelo garçon
Lionel. Todos servidos e bem sentados, o Lionel puxou um vibrafone e começou a
tocar, sem saber quem eram os comensais. Bom, a surpresa completa e, como a
qualidade do vibrafonista Lionel era tamanha, eles foram pegar seus
instrumentos de trabalho e montaram uma Jam session por horas, finda a qual, o
Lionel virou banda.
É o que jura
o Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO. Publique-se a lenda!
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