----------------------------------------------------------------------------
O BISCOITO MOLHADO
Edição 4188 Data: 14 de
Maio de 2013
----------------------------------------------------------------------------
RÁDIO MEMÓRIA NO DIA DAS MÃES
Quando o Jonas Vieira anunciou Branca
Dieckmann, pensei logo em nepotismo, no Fred sendo o próximo convidado, isso porque
esperei o início do programa lendo o noticiário político, mas, às primeiras
palavras dela, logo revi o meu pensamento.
-Branca Dieckmann.
-Branca Euler. - corrigiu a Branca.
Tudo bem, o sobrenome alemão
permanecia.
Não estavam lá apenas o casal de Santa
Teresa, substituindo o Sérgio Fortes; foi convocado também o médico Fernando
Borer cujo ânimo era de paciente, ouvidas as suas primeiras palavras. Sofria
com uma famigerada dor na coluna, disse, confirmando a informação do titular do
programa.
Talvez, penalizado com o seu esforço
por ali estar, Jonas Vieira lhe deu a primazia de fazer a primeira escolha. E
ele não decepcionou os ouvintes, pedindo “Brejeiro”. Depois, aludiu ao fato de
essa composição de Ernesto Nazaré ser de 1890 e a sua primeira gravação só
acontecer em 1930.
-Um absurdo que uma obra-prima tenha
levado 40 anos para ser gravada. - indignou-se.
Ainda fez considerações sobre o Choro,
que teve sua ascendência em 1870 e decadência em 1960, sendo retomado pela
pianista paulista Eudóxia de Barros. A gravação que solicitava era com ela e o
Conjunto do Evandro.
Enquanto essa criação do Ernesto Nazaré
encantava aquela manhã de domingo, eu me reportava à minissérie Chiquinha
Gonzaga, que foi ao ar uns 10 anos atrás na TV Globo. A história, bem fundamentada em dados
históricos, mostra Joaquim Calado, compositor e flautista, como o mestre de
Chiquinha Gonzaga e de outros músicos, nos poucos anos que viveu, 32 anos (1848 a 1880).
Ricardo Cravo Albim e outros
musicólogos consideram Joaquim Calado o pioneiro, aquele que pode ser
considerado o criador do Choro ao incorporar a flauta aos violões e cavaquinho.
Foi ele o primeiro a gravar a palavra Choro no local destinado ao gênero
musical na partitura da sua polca “Flor Amorosa”. Bem entendido que Choro não é
um ritmo específico, mas a maneira de se tocar solta e sincopada, com floreios
e improvisações. Assim, os tangos brasileiros, além das polcas de Ernesto
Nazaré, se tornaram Choro.
Tocada a última nota do “Brejeiro” pela
Eudóxia de Barros e o Conjunto do Evandro, Jonas Vieira se penitenciou por não
ter concedido a primeira opção à Branca.
-Acontece nas melhores famílias
inglesas. - justificou-se.
Como se já tivesse substituído o Sérgio
Fortes em férias passadas, Branca se mostrou à vontade e escolheu a gravação
que me proporcionou a maior surpresa do Rádio Memória desse domingo, ao
escolher uma gravação que eu desconhecia inteiramente, o “Boogie Woogie Bugle
Boy”, com “The Andrews Sisters”.
Disse a Branca que as três irmãs
gravaram “Boogie Woogie Bugle Boy” em 1941, antes de os Estados Unidos entrarem
na Segunda Grande Guerra Mundial. E prosseguiu com essas palavras que julgo ter
entesourado na memória:
-Pode-se dizer que é a primeira
gravação de “Rock and Roll” vinda do “Rythm and Blues”.
Jonas Vieira acrescentou que o começo
foi nos anos 40, como continuação do “Swing”.
Ouviu-se, então, a voz do Dieckmann que
falava em “Hot Music” e nos ritmos que foram os precursores do “Rock”.
A Branca retomou a palavra para dizer
que as irmãs obtiveram grande sucesso, trabalhando com Benny Goodman e Tommy
Dorsey e, como curiosidade, uma delas, Patrícia, morreu agora, em 2013, com 95 anos de idade.
-Abrimos o obituário. - não perde o
Dieckmann a piada, mesmo que seja humor negro.
Ouvi “Boogie Woogie Bugle Boy” e fiquei
tão entusiasmado que tratei de pesquisar. O trio “The Andrews Sisters” era
formado pelas irmãs La Verne ,
Maxena e Patty. As três se completavam,
pois cada uma tinha um registro vocal da voz feminina: soprano, meio-soprano e
contralto. Segundo o Wikipedia, venderam mais de 75 milhões de discos.
Quando chegou a vez do Dieckmann, ele
foi tão enfático que julguei que pediria Maria Callas, mas se tratava Madeleine
Peyroux.
-Eu julgava que Madeleine Peyroux fosse
francesa, mas ela é americana.
Seguiu adiante:
-Eu quero ouvir a gravação dela de um
grande sucesso de Ray Charles, “I can't stop loving you”.
E reportou-se aos tempos de garoto.
-Lá por 1961, 1962, os vizinhos de cima
chegaram dos Estados Unidos com o compacto dessa música com Ray Charles, que eu
ouvi à exaustão.
Quanto a mim, não tinha, nessa época,
vizinhos que viajavam aos Estados Unidos, creio que, na Rua Cachambi, ninguém
ia além de Nova Iguaçu, mas também ouvi o Ray Charles até ficar rouco, cantando
“I can't stop loving you”, porque era o grande sucesso do programa “Peça bis
pelo telefone”, da saudosa (antes de o Brizola comprá-la) Rádio Mayrink Veiga.
E os comentários continuaram depois de
emitida a última nota.
-Eu só fui entender as palavras do “I
can't stop loving you” com a Madeleine Peyroux, porque com o Ray Charles era
impossível.
-Jonas Vieira, com a sua bagagem de
professor de inglês, concordou com o Dieckmann.
Fernando Borer interveio citando Frank
Sinatra e Nat King Cole como cantores de dicção irrepreensível, o que é uma unanimidade.
Jonas Vieira lembrou que os negros,
como Ray Charles são enfáticos, quando cantam. Branca acrescentou que o negro valoriza
mais a interpretação, expõe mais a emoção.
Recordei-me de uma edição pretérita do seu O BISCOITO MOLHADO em que,
baseado em alguns adeptos da música popular, como Arthur da Távola, escrevi que
Elvis Presley tinha a voz de negro. Elio Fischberg concordou, mas o Dieckmann
investiu contra diferenças raciais na voz.
Mas voltemos ao presente, pois chegou a
vez do segundo pedido do Fernando Borer. A cantora da música que pediu era
negra, mas de uma dicção perfeita, Elizeth Cardoso, aquela que recebeu o título
dado por Sérgio Porto de “Divina”.
A gravação era “Tudo é magnífico”, de
Luís Reis e Haroldo Barbosa.
Todos aprovaram a sua escolha, mas ele
confessou que não sabia quem era o pianista dessa gravação.
-Luís Reis. - aparteou o titular do
Rádio Memória.
Fernando Borer disse que assim supôs,
mas que não tinha certeza de quem tocaria o piano. Em seguida, enalteceu
Haroldo Barbosa, uma escola do rádio brasileiro, de onde vieram artistas como
Chico Anísio.
Haroldo Barbosa e Max Nunes, pensei.
Também me veio à mente, a coluna do Globo “Pangaré gostou”, “Pangaré não
gostou”, que o Haroldo Barbosa escrevia, aliás, Luís Reis era outro turfista.
Enquanto soava a belíssima voz da
Elizeth Cardoso, recordei-me de um sorteio que o Dieckmann promovera há uns dez
anos, quando trabalhava na ANTAQ.
Sorteou a sua coleção de Elizeth Cardoso e a felizarda foi a nossa
colega Amelinha. Por coincidência, ela era muito amiga de um tal de Haroldo,
que, vim a saber, era filho do Haroldo Barbosa.
-Essa gravação da Elizeth Cardoso é
definitiva. - afirmou o Fernando Borer com o entusiasmo de quem não sentia mais
dores na coluna.
Nenhum comentário:
Postar um comentário