--------------------------------------------------------------------------------
O BISCOITO MOLHADO
Edição 3 998
Data: 30 de julho de 2012
-------------------------------------------------------------------------------
A ÚLTIMA SESSÃO DO SABADOIDO... DO MÊS DE JULHO
-Daniel, eu soube que você não trabalhou
ontem porque era dia de Santana. Santa Cruz, que eu saiba é bairro, e não,
cidade. - foram as minhas primeiras palavras dirigidas a ele naquele sábado.
-Carlão, Santana é padroeira da Casa da
Moeda, por isso, não houve trabalho.
-Nunca soube de coisa parecida. - reagi
com espanto.
-E você, Carlinhos, já voltou das
férias?- perguntou-me a Gina.
-Cheguei ao trabalho, na quinta-feira, e
estranhei que, no desenrolar do expediente, só apareceram uns gatos pingados. Percebi, então, que quase todo o mundo aderiu
a greve.
-E você não retornou para casa?...
-Gina, os próprios sindicalistas se
tornaram cabos eleitorais da Dilma Rousseff na campanha eleitoral. Colegas
meus, que frequentavam reuniões com sindicalistas, falavam que eles pediam para
votar na Dilma porque não haveria aumento de salários com o José Serra na
presidência.
-E eles? - quis saber minha cunhada.
-Gina, o próprio Lula disse, meses antes
da eleição, para os pedintes aproveitarem aquele momento. Com a gastança que
foi feita, a Dilma, como presidente da República, teria de segurar as despesas
para a inflação não sair do controle.
E acrescentei:
-O Lula teve a vantagem de herdar a casa
arrumada pelo Fernando Henrique Cardoso e a demanda absurda dos chineses que
elevaram os preços da maioria dos produtos que exportamos. A Dilma, além de
pegar a desarrumação do Lula, tem de enfrentar a demanda bem menor da China
pelos nossos produtos, para não falar na crise – a marolinha do Lula - que
cresceu ainda mais.
-Com isso, você se tornou um adepto da
Dilma e está furando a greve?- ironizou ela.
-Gina, há tanta gente no meu trabalho,
que não quer nada, embolsando um salário que 95% dos brasileiros não recebem e
eu ainda vou exigir que os contribuintes ainda repassem mais dinheiro para
eles... Mesmo eu sendo beneficiado, estou fora.
-É isso aí, Carlão. - aprovou meu
sobrinho.
-Quando os sindicalistas das agências
reguladoras iam ao nosso ambiente de trabalho e eu era obrigado a ouvi-los,
eles criticavam o FHC e elogiavam o governo petista. A crítica recorrente era
que o Fernando Henrique Cardoso não deu um aumento sequer ao funcionalismo
público(*). Ora, com o Plano Real e o fim da hiperinflação, houve, de cara,
ganho no poder aquisitivo. Lembra-se do frango a 1 real, a garrafa de vinho
Gato Negro a 5 reais, latinhas de cerveja a 0,40 centavos...
-Mas não foi só a inflação que caiu. -
interveio o Claudio.
-Sim, contribuiram outros fatores,
principalmente o câmbio.
Gina aproveitou e citou os preços de
vários produtos de primeira necessidade, em 1994/1995, valendo-se da sua
prodigiosa memória e das suas 20 mil horas de supermercado.
Retomei a palavra:
-Nosso salário de servidores públicos
dos últimos anos do governo Sarney até junho de 1994 se aviltou tanto que, já
no governo Collor, nós passamos a trabalhar meio-expediente. As autoridades não
tinham moral de nos obrigar a cumprir as 40 horas semanais. No governo FHC,
veio a ordem de retornarmos ao horário integral e nós obedecemos porque não
havia como negar a melhora indireta no nosso salário com esse ganho de poder
aquisitivo com o Plano Real.
-Os sindicalistas só entendem quando
veem mais dinheiro no bolso. - disse o Claudio.
-O lamentável é que até colegas meus que
estudaram economia não sabem diferenciar aumento real de aumento nominal.
-Carlinhos, soube que o Daniel foi
chamado para trabalhar na DATAPREV? - mudou a Gina de assunto.
-Foi?...
-Ele fez o concurso há algum tempo,
passou e o chamaram agora.
-Vou permanecer na Casa da Moeda porque
a DATAPREV não tem santa padroeira, e eu sou muito religioso.
Gina foi menos concisa na informação do
que o meu galhofeiro sobrinho.
-Ele conversou com o Serginho (primo),
que trabalhou lá, e não houve demonstração de entusiasmo. Além disso, a DATAPREV
fica em Botafogo, e o Daniel teria de se espremer no metrô de Pavuna, enquanto
na Casa da Moeda ele tem ônibus em casa e pega o fluxo maior do trânsito no
sentido contrário.
-Daniel, eu entro no trabalho e saio uma
hora antes para ser menos sufocado no metrô Pavuna-Botafogo. O mais importante,
no entanto, para você é o melhor emprego monetariamente falando.
-A Casa da Moeda, Carlão.
-O nome já diz tudo. - brinquei.
-O Daniel fez um concurso em que acertou
todas as questões e até hoje não foi chamado. Um dia, telefonei pra lá exigindo
explicações, e me disseram que, para a região escolhida por ele, ninguém foi
ainda convocado.
-Escolheu o Senado Federal, onde os
concursados não tem vez? - perguntei à Gina, porque o Daniel já havia se
retirado da cozinha.
-Eu vou ao Carrefour comprar laranjas. -
anunciou meu irmão.
Eu, que comprara na barraca da Rua
Itamaracá, no caminho, bananas e mamões papaias, sugeri que comprasse as
laranjas lá.
-As laranjas são para a mamãe, e você
sabe como ela é... pode ser assim, assado, desde que comprada no Carrefour.
Dito isso, saiu, enquanto o Daniel
reaparecia.
-Carlão, o computador é todo seu.
Enquanto a Gina se aprestava para sair
com a irmã e o Daniel se informava pela televisão sobre as primeiras provas das
Olimpíadas de Londres, eu, diante do ecrã do computador, saía de uma mensagem
eletrônica para outra. Uma hora passou
rapidamente e eu já ouvia a presença do meu irmão, que vinha do Carrefour. Em
seguida, soou a voz repetitiva do Vagner do portão da casa, chamando-o.
-Ele não pode esperar?- reclamou.
Tarde, lá pelas 10h 20min, o telefone
chamou a atenção com a sua música eletroacústica, e o Daniel atendeu.
-O Luca já está na área. - apregoou.
Pouco depois, eu comparecia a última
sessão do sabadoido do mês de julho. Luca narrava a dor que sentiu.
-Doía aqui, a um palmo abaixo do umbigo.
Podia ser infecção urinária...
-Era dor de gemer? - interrompi.
-Eram dores fortes.
-Certa vez, levei um vizinho (o
português Orlando) de carro para o Hospital Salgado Filho às 5 horas da manhã.
Era infecção urinária e ele gemeu o tempo todo.
Luca reatou a sua narrativa:
-Telefonei para o meu sobrinho, o André,
em São Paulo
e ele me pediu para transcrever os sintomas, o local... Falou em infecção
urinária e na possibilidade de hérnia. Fui para a emergência do Pasteur,
examinaram-me...
-Foi quando?- interrompi de novo.
Depois de responder pacientemente que o
fato ocorrera no dia anterior, prosseguiu:
-Examinaram-me, e fui para casa. A dor
não passou, e a minha filha, a Carolina, me deu Dipirona e eu me senti melhor.
E concluiu:
-Claudiomiro, eu não posso beber hoje.
(*) Na
Petrobras, o nome de FHC era palavrão, fosse por querer privatizar e mudar para
PetrobraX (como se fosse do Eike), ou fosse porque muita mordomia foi pelo
ralo. Hoje, já se ouvem severas (e bem informadas) críticas ao Lula e o que ele
fez com a Petrobras, devido à aplicação de política industrial nacional e do
controle da inflação da moeda à custa da empresa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário