MESMA VELHICE
Justiça se
faça ao rock: nenhuma outra música envelheceu tão bem. Tome alguns artistas do
Rock in Rio e veja como eles eram em começo de carreira, nos anos 60: jovens,
magros, bonitos, "rebeldes", contestadores, com longas e louras
cabeleiras. Na Califórnia, as moças se furavam mutuamente os olhos pelo simples
direito de contemplar Jim Morrison, o líder dos Doors.
Morrison
morreu ao tomar banho, em 1971, aos 28 anos, em Paris. Se tivesse sobrevivido,
teria hoje 71, e como estaria? Talvez igual à maioria dos seus companheiros de
geração: velho, gordo, feio, desdentado (cocaína faz mal aos dentes), careca ou
com restos de cabelo branco, botina, calça de lona, munhequeira e colete aberto
sobre a barriga branca e insubmersível.
Mas, agora,
vem o lado bonito da coisa. O fato de esses homens terem hoje mais de 70 anos e
serem, quem sabe, diabéticos, não incomoda seus jovens fãs. Sim, os caras
envelheceram, e daí? – dirão os garotos. Está certo. A idade provecta não lhes
tira o direito de se apresentarem. E a mídia continua apaixonada por eles.
Bem
diferente do que aconteceu quando eles surgiram nos anos 60. Naquela época, nos
EUA, no Brasil e em toda parte, os artistas tradicionais, os grandes cantores,
que se apresentavam bem vestidos e mal tinham passado dos 50 anos, foram
varridos de cena pela chegada do rock. Os empresários e a mídia os abandonaram.
Tiveram de se aposentar. Eram "velhos". O público jovem de então os
desprezava porque, entre outros defeitos, eles eram adorados por seus pais – e
não se admitia a um garoto de 1968 admirar o mesmo artista que seus pais.
No Rock in
Rio, é comum ver avós, filhos e netos admirando o mesmo artista – três gerações
incrivelmente niveladas pela mesma velhice. É inédito – nem a polca, a habanera
e a umbigada conseguiram isso.
Ruy Castro (da Folha de São Paulo)
Ruy Castro (da Folha de São Paulo)
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