Total de visualizações de página

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

2738 - o sexo frágil no Rádio Memória


           

----------------------------------------------------

O BISCOITO MOLHADO

Edição 4988                                    Data: 20  de  novembro de 2014

-----------------------------------------------------------

 

MULHERES NO RÁDIO MEMÓRIA

PARTE II

 

-Como é o nome dela?

-Luciana Requião.

Era a convidada desse domingo, que abriu musicalmente o programa com o “Corta Jaca” de Chiquinha Gonzaga.

-Você é altamente qualificada, participa efetivamente de uma orquestra, a que tocou agora.

-A Orquestra Lunar. - completou ela as palavras do titular do programa.

-A Luciana é mais difícil de dizer o que ela não faz; instrumentista, arranjadora, professora... participou de  seis seminários “A Mulher na Música”.

Sérgio Fortes foi aparteado pelo galanteador Jonas Vieira.

-A mulher é a própria música.

Sérgio Fortes quis saber da convidada se a participação da mulher no mundo da música era crescente;  ela respondeu que sim, citou o instrumento em que é versada, o baixo elétrico  que, anos atrás, era praticamente do domínio masculino. Mas fez algumas ressalvas:

-Ainda encontro dificuldades quando procuro uma substituta para mim no baixo elétrico. Também é meio complicado quando se procura uma mulher que toque bateria, trombone...

Sérgio Fortes aludiu à época em que Paulo Fortes atuava no Teatro Municipal; acompanhando o pai, olhava para as orquestras e quase não via mulheres. A Filarmônica de Berlim, que surgiu em 1842, só aceitaria a primeira mulher em 1997, a harpista Anna Lelkes; Sérgio, porém, se limitou somente à discriminação no Brasil.

Em seguida, perguntou a ela sobre o começo do projeto “Mulheres na Música”. Luciana Requião respondeu que a ideia envolvia sindicatos, principalmente o canadense, que acabou se desenvolvendo em vários lugares.

-Você acha que há diferença entre o sentimento masculino e feminino? - aflorou a curiosidade do Jonas Vieira.

-Acho que não, acho que o sentimento é o mesmo. - respondeu ela.

-Não acha que a mulher é mais profunda? - insistiu o Jonas.

-Nem sempre,

-Pelo menos na música popular, na clássica também, mas, principalmente na popular, as músicas dos homens são dedicadas às mulheres. - disse o Jonas Vieira.

-Acho que a mulher é um tema comercial.

Jonas Vieira, sem perder um segundo, contestou:

-É tema sentimental mesmo. A favor ou contra, fala mal ou fala bem.

Ainda ressoava a observação dele quando recebeu o Monarco como convidado do Rádio Memória.

-As suas letras são todas mandando bala nas mulheres.

 Ela argumentou que, agora, que as mulheres entraram na composição com a força dos homens, que, numa pesquisa, talvez se encontre muitas compositoras falando bem ou mal dos homens.

Um parêntese: forçosamente a “anima” do Chico Buarque de Holanda deveria entrar na relação dessa estatística das compositoras. 

-E qual é a segunda música, Luciana?

A música inicial que escolhi foi de Chiquinha Gonzaga que tem tudo a ver com o primeiro seminário dedicado a ela. O segundo seminário homenageou Áurea Martins. Eu trouxe um CD com as faixas “Pressentimento” e “Mas Quem Disse Que Te Esqueço”.

-É a Orquestra Lunar?

-Não, é solo dela.

Depois, ela nomeou os compositores; “Pressentimento”, de Elton Medeiros e Hermínio Bello de Carvalho, e “Mas Quem Disse Que Te Esqueço”, de Ivone Lara e Hermínio Belo de Carvalho. E acrescentou que as letras de todas as faixas desse CD são de Hermínio Bello de Carvalho.

-Ele é ligado aos grandes nomes da música popular brasileira: Cartola, Paulinho da Viola... É uma das pessoas que mais admiro. - exultou o Jonas Vieira.

Lembramos que Hermínio Bello de Carvalho recomendou ao adolescente Turíbio Santos anotar meticulosamente tudo que o Villa-Lobos dissesse numa conferência, em 1958, o que redundou no livro “Villa-Lobos e o Violão”.

-Luciana, uma curiosidade: Chiquinha Gonzaga é um ícone; é o marco zero da participação feminina na música popular brasileira, ou há algum registro anterior? - quebrou o Sérgio Fortes o seu silêncio de alguns minutos.

-Se olharmos a história, é ela. Deve haver outras Chiquinhas por aí que não tiveram oportunidade de vir para a história. - foi a resposta.

Jonas Vieira interveio incisivamente:

-Chiquinha Gonzaga é o marco zero.

Breque.

Chiquinha Gonzaga, como mulher, é um caso único na música popular de todo o mundo. Para citar uma das suas mil realizações, criou um gênero musical: a marchinha carnavalesca. Na biografia escrita pela sua neta, Dalva Lazaroni, que acabamos de ler, recentemente, a magnitude dessa extraordinária mulher é evidenciada; não havia necessidade de exageros, como dizer que Machado de Assis a procurou para aprender francês. Menos, Dalva Lazaroni, menos, Prossigamos com o Rádio Memória.

Sérgio Fortes insistiu com outra pergunta:

-Na fase áurea da música popular brasileira, décadas de 30 e 40, você encontra uma compositora, ou era um tabu?

-Havia a Marília Batista. - antecipou-se o Jonas Vieira.

-Depois, tivemos a Dolores Duran. - disse ela.

-Dolores Duran é década de 50. - acrescentou o titular do Rádio Memória.

-Nós temos no nosso CD “Quem Sou Eu Pra Perdoar” da Carolina Cardoso de Menezes.

-Esta, sim, é compositora da década de 30. Foi importantíssima. - ressaltou o Jonas Vieira.

-O grande público, até mesmo as novas musicistas desconhecem a Carolina Cardoso de Menezes. - constatou a convidada do Rádio Memória.

Mais um breque.

Carolina Cardoso de Menezes, também inspirada pianista, que compôs sambas e choros com  ousados arranjos seus, morreu em 1999, com 83 anos de idade, no Méier, decepcionada por não ter sido convidada para participar da minissérie “Chiquinha Gonzaga”, da TV Globo. Um esquecimento lamentável, pois foi sucessora dela.

Indignado, Jonas Vieira investiu contra a ignorância que grassa neste país.

-Nós não temos uma divulgação adequada; isto em todos os sentidos. A música popular não é conhecida, infelizmente. Pergunte sobre futebol, e todos saberão responder. A massa pensa que Villa-Lobos é um beque do Olaria. 

Por isso, é massa de manobra de políticos e marqueteiros. - assinalamos.

E continuou:

-Eu vou dar um exemplo claro de alguém que contribuiu para este país e é desconhecido; morreu, recentemente, o poeta Manoel de Barros; era gênio, gênio, uma figura extraordinária que se casa com a natureza; o poeta da natureza, sendo profundo é de uma grande simplicidade.

E escandiu bem as sílabas:

-Ninguém conhecia.

Concluiu:

-Manoel de Barros é um dos quatro grandes poetas da minha predileção; ele, Drummond, é claro, Fernando Pessoa, que era fantástico... O outro era de Pernambuco, o meu favorito... Qual é mesmo o nome dele?...

A traiçoeira memória pregava uma peça no Jonas Vieira.

 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário