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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4921 Data: 07 de agosto de
2014
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ADEMILDE FONSECA NO RÁDIO MEMÓRIA
2ª PARTE
A superação do Sérgio Fortes animou a
Eimar Fonseca e ela disse que espera conseguir também superar as barreiras
emocionais que a impediam de se reaproximar da sua falecida mãe.
-Vamos ouvir um pouco de música?
-O pedido do Simon Khoury foi, por
momentos, ignorado, pois o tema ainda não se esgotara.
-Minha mãe admirava muito o seu pai.
-Meu pai era muito ligado a cantor que
sabia cantar. Imagine, então, o apreço que ele tinha pela Ademilde Fonseca. -
retribuiu o Sérgio Fortes.
Simon Khoury deixou, também, de lado o
seu pedido por música e indagou da convidada sobre o fato de ela ter cantado
com a mãe. Eimar passou a falar sobre uma exibição da Ademilde Fonseca em que
ela se pôs a apreciar na primeira fila.
-Tudo o que ela cantava, eu repetia
baixinho.
E se voltou para o maridão:
-Onde foi mesmo?
-No Centro Cultural Banco do Brasil. -
respondeu sem titubear.
-Ele é minha memória.
Depois desse reconhecimento, prosseguiu
dizendo que notou que a sua mãe estava insegura por causa de um pigarro que lhe
tirava a limpidez da voz.
-Ela, então, anunciou “Brasileirinho”. A
plateia aplaudiu, e ela me chamou para subir ao palco. “Eimar, minha filha,
vem.” “Eu?!...” “Eu tenho outra filha?” Eu fui supernervosa, pois sou
extremamente tímida. No palco, ela sempre me olhava quando eu tinha de entrar
cantando.
Foi um triunfo que ela atribuiu ao fato
de o público emocionar-se assistindo à dupla formada por mãe e filha.
E rapidamente entra o “Brasileirinho”,
na voz de Ademilde Fonseca, sem que o
Sérgio Fortes tivesse tempo de dizer, antes: “Vamos ouvir.”
-Que compositor foi o Waldir Azevedo! -
enlevou-se o parceiro do Jonas Vieira para emendar a seguinte pergunta à
convidada:
-Quem você identifica nessa gravação?
-Dino 7 Cordas, Jorginho do Pandeiro, o
próprio Waldir Azevedo.
-O Abel Ferreira. - apontou o Simon
Khoury.
-Você cantou com a sua mãe e eu imagino
se tivesse de subir ao palco para cantar com o meu pai. Eu morreria.
A probabilidade seria mesmo grande de o
Sérgio Fortes não sobreviver, haja vista o comportamento da plateia operística,
extremamente exigente. E ainda havia uma agravante: ele não poderia dizer para
o público o que disse o tenor vaiado da anedota; “aspetta il baritono”
(“esperem só o barítono...), porque, no caso, o barítono é o Paulo Fortes.
-Você tem registro cantando com a sua
mãe? - indagou-lhe o Simon Khoury.
-Tenho vários, mas num show que fiz, no
“Panorama Hall”, ela deu uma canja e cantou comigo “Camisa Listrada”, do Ary
Barroso.
E logo a gravação se fez ouvir.
Agora, era o Simon Khoury que aventava a
hipótese de os Fortes, pai e filho, entoarem um dueto.
-Eu tive a oportunidade. A coisa mais
concreta que aconteceu foi quando acompanhei, com 15 anos de idade, no uniforme
do Santo Inácio, uma aula de canto do meu pai. Ao terminar a aula dele, a
professora Pina Mônaco, que parecia a rainha da Áustria, voltou-se para mim e
disse: “Agora você”. Ela foi tão impositiva, que eu não pude recusar.
O que Sérgio Fortes cantou? “Di Quella
Pira”, do Trovador?... “A Te O Cara”, dos Puritanos?... “Ah, Mes Amis”, da
Filha do Regimento, ária que lançou o Pavarotti ao estrelato depois dos nove
dós de peito que ele emitiu?... O filho do Paulo Fortes não desfez esse
mistério, revelou apenas que a professora chorou.
-Chorou por quê? - percebemos nós,
ouvintes do Rádio Memória, a maldade na pergunta do Simon Khoury.
-Foi emoção. - antecipou-se a Eimar
Fonseca com a sua sensibilidade de artista.
Sérgio, porém, acatou o espírito gozador
do Simon Khoury e se reportou ao professor de violino Léo, da revista
Luluzinha, que arrancava os poucos cabelos da cabeça todas as vezes que o seu
aluno Bolinha tocava.
Simon Khoury, aproveitando o clima de
descontração, contou a piada do Máximo, um sujeito que tinha ojeriza ao nome e
que não queria, de maneira alguma, que ele fosse citado no seu epitáfio. Como
chegamos até aqui, vamos terminar a piada.
Após a morte do Máximo, atenderam ao seu
último pedido, mas as pessoas que liam na sua lápide que ele fora um filho e
marido exemplar, trabalhador honestíssimo, amigo leal, querido por todos,
diziam: “Esse sujeito é o Máximo”.
-Ouvindo a gravação - reportou-se o
Sérgio Fortes ao “Camisa Listrada”, -
Ademilde Fonseca já estava com bastante idade?
-90 anos. - esclareceu a Eimar Fonseca.
-Eu, que sou filho de cantor de ópera,
que sempre acompanhei ópera, digo que a Ademilde Fonseca possui a técnica de
uma cantora de ópera e isso possibilitou que ela tivesse essa voz aos 90 anos de idade.
E prosseguiu Sérgio Fortes:
-Eu vejo essa turma de cantores se
esgoelando que, quando chegar aos 50 anos, acabou.
-O registro da minha mãe era de soprano
ligeiro.
-As inflexões dela era de quem tinha
formação clássica. - frisou o Sérgio.
Eimar Fonseca disse que tudo vinha dela
mesmo, que era intuitivo e que, depois, foi aprimorado.
-Ela se inspirou em Carmem Miranda? -
foi a pergunta do Simon Khoury.
-Não; mamãe ouvia muito Araci de
Almeida, Linda e Dircinha Batista.
E se referiu ao pai, Naldimar Delfino,
que se destacou como violonista.
-Meu pai era fã da Araci da Almeida.
Eles moravam em Natal e compravam os discos da Araci de Almeida logo que
chegavam lá.
Simon Khoury interveio para se reportar
a um bandolinista que afirmou que não pode fazer com o bandolim o que a
Ademilde Fonseca fazia com a voz.
-A voz dela parecia um instrumento
musical.
-Há gravações em que a voz da Ademilde
Fonseca se confunde com instrumento musical. - seguiram-se as palavras do
Aírton Barreto às da esposa.
E mais uma vez sem dar tempo de o Sérgio
Fortes dizer “Vamos ouvir”, entrou a gravação de “Apanhei-te, Cavaquinho”.
Choro que Ernesto Nazareth compôs em 1915, em homenagem, segundo os estudiosos,
a Mário Cavaquinho, exímio cavaquinista. O título parece uma provocação ao amigo,
que teria de acompanhar a velocidade vertiginosa das teclas do piano nas cordas
do cavaquinho. Ademilde Fonseca, por sua vez, aceitou o desafio, com êxito,
usando o seu instrumento, as cordas vocais.
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