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terça-feira, 12 de agosto de 2014

2671 - pais e filhos




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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4921                                      Data:  07 de  agosto de 2014
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ADEMILDE FONSECA NO RÁDIO MEMÓRIA
2ª PARTE

A superação do Sérgio Fortes animou a Eimar Fonseca e ela disse que espera conseguir também superar as barreiras emocionais que a impediam de se reaproximar da sua falecida mãe.
-Vamos ouvir um pouco de música?
-O pedido do Simon Khoury foi, por momentos, ignorado, pois o tema ainda não se esgotara.
-Minha mãe admirava muito o seu pai.
-Meu pai era muito ligado a cantor que sabia cantar. Imagine, então, o apreço que ele tinha pela Ademilde Fonseca. - retribuiu o Sérgio Fortes.
Simon Khoury deixou, também, de lado o seu pedido por música e indagou da convidada sobre o fato de ela ter cantado com a mãe. Eimar passou a falar sobre uma exibição da Ademilde Fonseca em que ela se pôs a apreciar na primeira fila.
-Tudo o que ela cantava, eu repetia baixinho.
E se voltou para o maridão:
-Onde foi mesmo?
-No Centro Cultural Banco do Brasil. - respondeu sem titubear.
-Ele é minha memória.
Depois desse reconhecimento, prosseguiu dizendo que notou que a sua mãe estava insegura por causa de um pigarro que lhe tirava a limpidez da voz.
-Ela, então, anunciou “Brasileirinho”. A plateia aplaudiu, e ela me chamou para subir ao palco. “Eimar, minha filha, vem.” “Eu?!...” “Eu tenho outra filha?” Eu fui supernervosa, pois sou extremamente tímida. No palco, ela sempre me olhava quando eu tinha de entrar cantando.
Foi um triunfo que ela atribuiu ao fato de o público emocionar-se assistindo à dupla formada por mãe e filha.
E rapidamente entra o “Brasileirinho”, na voz de Ademilde Fonseca,  sem que o Sérgio Fortes tivesse tempo de dizer, antes: “Vamos ouvir.”
-Que compositor foi o Waldir Azevedo! - enlevou-se o parceiro do Jonas Vieira para emendar a seguinte pergunta à convidada:
-Quem você identifica nessa gravação?
-Dino 7 Cordas, Jorginho do Pandeiro, o próprio Waldir Azevedo.
-O Abel Ferreira. - apontou o Simon Khoury.
-Você cantou com a sua mãe e eu imagino se tivesse de subir ao palco para cantar com o meu pai. Eu morreria.
A probabilidade seria mesmo grande de o Sérgio Fortes não sobreviver, haja vista o comportamento da plateia operística, extremamente exigente. E ainda havia uma agravante: ele não poderia dizer para o público o que disse o tenor vaiado da anedota; “aspetta il baritono” (“esperem só o barítono...), porque, no caso, o barítono é o Paulo Fortes.
-Você tem registro cantando com a sua mãe? - indagou-lhe o Simon Khoury.
-Tenho vários, mas num show que fiz, no “Panorama Hall”, ela deu uma canja e cantou comigo “Camisa Listrada”, do Ary Barroso.
E logo a gravação se fez ouvir.
Agora, era o Simon Khoury que aventava a hipótese de os Fortes, pai e filho, entoarem um dueto.
-Eu tive a oportunidade. A coisa mais concreta que aconteceu foi quando acompanhei, com 15 anos de idade, no uniforme do Santo Inácio, uma aula de canto do meu pai. Ao terminar a aula dele, a professora Pina Mônaco, que parecia a rainha da Áustria, voltou-se para mim e disse: “Agora você”. Ela foi tão impositiva, que eu não pude recusar.
O que Sérgio Fortes cantou? “Di Quella Pira”, do Trovador?... “A Te O Cara”, dos Puritanos?... “Ah, Mes Amis”, da Filha do Regimento, ária que lançou o Pavarotti ao estrelato depois dos nove dós de peito que ele emitiu?... O filho do Paulo Fortes não desfez esse mistério, revelou apenas que a professora chorou.
-Chorou por quê? - percebemos nós, ouvintes do Rádio Memória, a maldade na pergunta do Simon Khoury.
-Foi emoção. - antecipou-se a Eimar Fonseca com a sua sensibilidade de artista.
Sérgio, porém, acatou o espírito gozador do Simon Khoury e se reportou ao professor de violino Léo, da revista Luluzinha, que arrancava os poucos cabelos da cabeça todas as vezes que o seu aluno Bolinha tocava.
Simon Khoury, aproveitando o clima de descontração, contou a piada do Máximo, um sujeito que tinha ojeriza ao nome e que não queria, de maneira alguma, que ele fosse citado no seu epitáfio. Como chegamos até aqui, vamos terminar a piada.
Após a morte do Máximo, atenderam ao seu último pedido, mas as pessoas que liam na sua lápide que ele fora um filho e marido exemplar, trabalhador honestíssimo, amigo leal, querido por todos, diziam: “Esse sujeito é o Máximo”.
-Ouvindo a gravação - reportou-se o Sérgio Fortes ao “Camisa Listrada”,  - Ademilde Fonseca já estava com bastante idade?
-90 anos. - esclareceu a Eimar Fonseca.
-Eu, que sou filho de cantor de ópera, que sempre acompanhei ópera, digo que a Ademilde Fonseca possui a técnica de uma cantora de ópera e isso possibilitou que ela tivesse essa voz aos  90 anos de idade.
E prosseguiu Sérgio Fortes:
-Eu vejo essa turma de cantores se esgoelando que, quando chegar aos 50 anos, acabou.
-O registro da minha mãe era de soprano ligeiro.
-As inflexões dela era de quem tinha formação clássica. - frisou o Sérgio.
Eimar Fonseca disse que tudo vinha dela mesmo, que era intuitivo e que, depois, foi aprimorado.
-Ela se inspirou em Carmem Miranda? - foi a pergunta do Simon Khoury.
-Não; mamãe ouvia muito Araci de Almeida, Linda e Dircinha Batista.
E se referiu ao pai, Naldimar Delfino, que se destacou como violonista.
-Meu pai era fã da Araci da Almeida. Eles moravam em Natal e compravam os discos da Araci de Almeida logo que chegavam lá.
Simon Khoury interveio para se reportar a um bandolinista que afirmou que não pode fazer com o bandolim o que a Ademilde Fonseca fazia com a voz.
-A voz dela parecia um instrumento musical.
-Há gravações em que a voz da Ademilde Fonseca se confunde com instrumento musical. - seguiram-se as palavras do Aírton Barreto às da esposa.
E mais uma vez sem dar tempo de o Sérgio Fortes dizer “Vamos ouvir”, entrou a gravação de “Apanhei-te, Cavaquinho”. Choro que Ernesto Nazareth compôs em 1915, em homenagem, segundo os estudiosos, a Mário Cavaquinho, exímio cavaquinista. O título parece uma provocação ao amigo, que teria de acompanhar a velocidade vertiginosa das teclas do piano nas cordas do cavaquinho. Ademilde Fonseca, por sua vez, aceitou o desafio, com êxito, usando o seu instrumento, as cordas vocais.




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