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segunda-feira, 25 de novembro de 2013

2512 - Vaidade não é crime



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4312                       Data: 15  de novembro  de 2013
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RÁDIO MEMÓRIA COM FLORISBELA E VAIDOSO

Nesse domingo, foi a vez de o Sérgio Fortes faltar. Será que eles já estão no revezamento de fim de ano, que faz a alegria dos funcionários públicos? Bem, no meu trabalho se iniciará daqui a pouco mais de um mês.
Para preencher a lacuna, Jonas Vieira apresentou  Anahi Ravagnani,  Gerente de Projetos Educacionais da Orquestra Sinfônica Brasileira, que também ensaia a criançada do coro. 
-Sérgio Fortes não veio porque sofre de dor de cabeça com as derrotas do Fluminense.
Pronto: estava devolvida a metáfora futebolística do último domingo.
Concedida à Anahi a missão de abrir musicalmente o programa, ela pediu “Só Danço Samba”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes”, na gravação do Trio 202 (Nélson Ayres no piano, Ulisses Rocha no violão e Toninho Ferragutti no acordeon), no Jazz Standard, em Nova York, ano 2007.
-Três cobras.
Enquanto Jonas Vieira elogiava os instrumentistas, ela exaltava o acordeon, que, segundo ela, se ajusta a qualquer tipo de música até a tarantela calabresa.(*)
Antes da sua escolha, o titular do programa afirmou que o segundo maior cantor para ele, sendo o primeiro Orlando Silva, é o Sílvio Caldas; pontuando que ele também é compositor, mas sem citar “Chão de Estrelas”. Em seguida, falou de Bororó, autor de uma obra pequena, mas com dois êxitos absolutos: “Curare” e da “Cor do Pecado”, e reportou-se à entrevista que Bororó lhe concedeu sobre Orlando Silva quando escrevia a biografia do cantor.
Peter acionou as carrapetas e ouvimos, então, “Da Cor do Pecado” na voz de Sílvio Caldas.
Anahi fez considerações técnicas da interpretação, elogiando o fraseado e a valorização da melodia.
Deu-se uma pequena pausa para as espinafrações do Brasil de hoje pelo Jonas Vieira, e a vez passou de novo para a integrante da OSB.
-Vamos continuar com os clássicos da música popular brasileira, e a gravação é “No Rancho Fundo”, de Lamartine Babo e Ary Barroso, com o violonista Yamandu Costa e Dominguinhos no acordeon.
-É um colírio musical. - vibrou o Jonas Vieira depois da audição.
-Há tantas porcarias, hoje, fazendo um baita sucesso.
As palavras da convidada foram o mote para ele desancar a falta de educação que se generalizou no país, com as pessoas falando alto nos restaurantes, em todo lugar, enfim.
Nós, do Biscoito Molhado, sofremos isso na carne, ou melhor, nos ouvidos. Certa vez, ao pegarmos o primeiro vagão de um trem do metrô, defrontamo-nos com umas senhoras espalhafatosas que provocavam tamanha cacofonia, que tentamos fugir para o último vagão. Mas isso é outra história.
Depois de aludir à viagem de Camus ao Brasil, em 1949, quando o escritor se espantou com a pouca civilidade dos motoristas, Jonas Vieira retornou aos domínios de Apolo, ou seja, à música. Ressaltou a excelência de Moacir Silva e listou vários instrumentistas que, num arranjo de Mário Adnet e Zé Nogueira, conceberam um disco dedicado a Moacir Silva, destacando a faixa “Flores”.
-Estamos bem. O melhor da música instrumental. - rejubilou-se a substituta do Sérgio Fortes.
Mais uma pausa para a espinafração. Jonas Vieira se insurgia outra vez contra o resgate dos cachorros do Instituto Royal em São Paulo. Se ele soubesse que resgatavam, agora, os ratos...
-Vamos denunciar, mas sem exorbitância. - contemporizou a Anahi.
-Só conheço o caminho do meio que pregam os budistas. - acrescentou ele.
A vez era da dama.
-Escolhi “A Violeira”, de Tom Jobim e Chico Buarque de Holanda com Mônica Salmaso, que possui um timbre que é um carinho para os nossos ouvidos.
Estamos numa democracia, até segunda ordem ou ordem unida, por isso revelamos a nossa  preferência  pela exuberante alegria da Clara Nunes na interpretação desse xote.
Agora, era a vez da Pausa para Meditação, crônica do Fernando Milfond sobre Agatha Christie, intitulada “uma vida espetacular.”
Houve o retorno para a segunda parte do programa e percebi que o Jonas Vieira, até então, anunciara o nome da rádio, a frequência sintonizada, enfim, não fazia o que ele tanto cobrou do Sérgio Fortes, segundo este, quando lhe passou o bastão no último domingo. Ele foi direto para a sessão musical.
-Das brilhantes composições de Chopin, aqui está a “Fantasia Improviso”, com Philippe Entremont ao piano.
Com a última nota do piano ainda ressoando nos nossos ouvidos, Anahi se manifestou sobre o quanto essa peça chopiniana lhe apeteceu e revelou que a “Fantasia Improviso” era a música preferida do seu pai.
-É a minha preferida também, mas gosto dela ainda mais orquestrada por Andre Kostelanetz.
Como Jonas Vieira já disse mais de uma vez que considera a invenção da orquestra a maior de todas as invenções do homem, não era de estranhar.
-Depois dos poloneses vamos aos franceses. - interveio a convidada descontraidamente.
E escolheu “Bidonville”, o Berimbau afrancesado de Baden Powell, na voz de Claude Nougaro. (**)
Depois de nos encantarmos com a bela dicção do canto de Claude Nougaro,  Anahi repetiu os nomes da música, compositor e cantor sem dar o crédito do Vinícius de Moraes. Jonas tentou corrigir essa falha, mas ela insistiu com Baden Powell apenas. Tudo bem, como diz o truísmo, acontece nas melhores famílias; o problema era o fato de ser o ano em que se comemora o centenário do “poetinha”.
Sentindo-se à vontade, não tanto quanto o Dieckmann que procurou se apossar do programa, ela disse da sua predileção pelos italianos, mas tinha de admitir que os franceses realizaram coisas lindas.
Tinha razão, no terreno da ópera, a Itália nos deu Verdi e Puccini, mas como esquecer a França que, com Bizet, nos deu “Carmen”? ... Que o diga o filósofo Nietzsche.
Música que segue. Jonas Vieira bisou Sílvio Caldas, na marchinha de carnaval “Florisbela”, de Eratóstenes Frazão e Antônio Nássara, pedindo atenção para o coro.
Nos comentários, Anahi exaltou os velhos carnavais de marchinhas como essas. Temos a dizer que a manifestação crítica do carioca, através de sambas e marchinhas carnavalescas, não morreu, mas a mídia simplesmente a ignora e ela só repercute o que se ajusta ao comércio em que foi aprisionado o carnaval. Quem pretende escutar uma marchinha bem atualizada politicamente com a engenhosidade dos carnavalescos de outrora, sugerimos acessar no youtube “Brasil descobriu Cabral”.
Anahi escolhia agora uma gravação de João Donato, na voz do “showman” Eduardo Dusek, “É Proibido Afinar o Piano”,
Muito melhor do que o “É Proibido Proibir”, transformado, quarenta e cinco anos depois”, em “É Proibido Não Proibir” (vide biografias). Foi uma agradável surpresa, pois desconhecíamos essa composição do João Donato. Jonas Vieira confessou também o seu desconhecimento, o que fez sua convidada vibrar:
-Quem diria que eu traria uma coisa desconhecida para você, que tem tanta cultura musical.
-Como dizia meu pai: “à lua falta uma banda.”
Rádio Memória chegava ao seu final, mas Jonas Vieira não se esqueceu do Dieckmann, pedindo “Vaidoso”, da autoria de Moacir Santos, faixa do disco com excelentes instrumentistas, que já foram mencionados. (***)
Com a convidada destacando as atividades da Orquestra Sinfônica Brasileira aos domingos de manhã, 11 horas, no Teatro Municipal, que são os “Concertos para Juventude”, o programa se encerrou. Mas Jonas Vieira ainda teve tempo de dar o seu “demorado abraço” nos senhores ouvintes.

(*) O Distribuidor do seu O BISCOITO MOLHADO tem perturbado a vida do Sergio Fortes, o mencionado e infeliz torcedor tricolor, pela escalação repetida do Caçulinha com seu acordeom em interpretações bossanovísticas. Sendo assim, pau na Anahi, por fazer o mesmo. O acordeom é interessante, mas não é gaita, cuja intimidade se ajusta ao quase colóquio da bossa. Ao contrário, o acordeom é grandiloquente e dá uma dimensão pouco adequada à Bossa Nova, independentemente da qualidade do intérprete.

(**) Bidon é aquele barril de lata de 200 litros e bidonville é a cidade em que as casas são construídas com paredes desse latão. Em uma concepção mais arejada, comunidade.

(***) Ouvido a respeito da jocosa lembrança, Dieckmann se disse homenageado, pois Moacir Santos é sempre bem vindo e que vaidade não é crime. Mais Dieckmann, impossível.

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