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segunda-feira, 25 de novembro de 2013

2511 - O Forfait



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O BISCOITO MOLHADO
Edição 4311                       Data: 12  de novembro  de 2013
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CARTAS  DOS LEITORES

-Li o Biscoito Molhado em que o Sérgio Fortes se viu em palpos de aranha porque teve de conduzir o Rádio Memória sozinho, apenas com o auxílio do Peter, o operador de áudio. Pretendo apenas fazer uma correção no texto, o tango que foi tocado não é “Per una cabeza”, e sim “Por una cabeza.” Elio.
BM: Elio, não é a primeira vez que, distraidamente, troco o espanhol pelo italiano. Ainda mais com esse tango que, de melodia tão bonita, nos faz devanear. Não foi à toa que o personagem cego do Al Pacino, quando satisfez um dos desejos da sua vida, no filme “Perfume de Mulher”, que era dançar, dançou “Por una cabeza” com uma bela acompanhante.
Há dois meses, assisti a um documentário que se desenrolou com os acontecimentos vividos pelo grande tenor argentino, Marcelo Alvarez, na gravação do seu disco com tangos de Gardel, apenas.
Na vez da faixa “Por una cabeza”, um especialista em Carlos Gardel se referiu à sua paixão pelo turfe, o que o levou a usar uma metáfora “por una cabeza”, para se referir à felicidade que não alcançamos por muito pouco e ao desespero da derrota inexorável.
No caso do Rádio Memória, acredito que Sérgio Fortes tocou esse tango para pontuar o “forfait” do Jonas Vieira.

-BULLYING. O jovem de 23 anos que provocou um caos no aeroporto de Los Angeles ao disparar contra um agente de segurança e ferir pelo menos sete pessoas teria sido vítima de bullying na escola. Arre! Eu também fui vítima de bullying: aluna medíocre, com débito de atenção, tímida, magra de braços compridos, gostava de pescar sozinha meus siris no mangue em Recife. E nem por isso saí dando tiros por aí. Agora, grande parte dos distúrbios  psicológicos é atribuída ao bullying! E pior: continuo sofrendo bullying aos 71 anos, dos espelhos, da minha casa e dos elevadores, que insistem em mostrar o que não sou. Arlette Mello.
BM: Sempre aparece um e outro leitor que demonstra mais razoabilidade e, até mesmo talento, do que medalhões que escrevem suas colunas nos jornais. Por isso, eu nunca deixo para trás a página das Cartas dos Leitores de um periódico sem a ler. Foi o que aconteceu agora, tive de pensar esta carta do nosso coirmão, O Globo.
O texto da Arlette Mello é uma pequena joia de lucidez e de humor pernambucano, mas que bem poderia ser britânico.
O que hoje chamam de bullying – o brasileiro e a sua mania de ser americano – sempre existiu. No meu tempo infanto-juvenil na escola, quem usasse óculos não escapava do apelido “Quatro olhos”. Os cabeçudos eram os “Cabeça de nós todos”, os gordos, “Bolão do Vasco”, os baixinhos, “Pintor de rodapé, e por aí ia.
Eu, como me iniciei no tabagismo com 13 anos de idade, era chamado de “maconheiro” e, nessa época, a maconha era maldita, não se falava em seu uso terapêutico e quem queria dar suas tragadas procurava um isolamento de Robinson Crusoé.
Já narrei esse caso, mas não custa repeti-lo.  No meio de uma aula de matemática, na 2ª série ginasial, o professor, uma autêntica chaminé, apalpou o bolso e se viu sem cigarros. Como não podia fumar o giz, recorreu ao grandalhão da turma. Não, ele também não tinha cigarros na mão.  Sentado, curvei o meu corpo para tirar da minha pasta um maço de Continental e dele um cigarro que levei até o professor. Na minha caminhada até ele, houve uma algazarra dos diabos da turma, com dois ou três mais ousados chamando-me pelo apelido. Depois de o professor sair da sala, poucos colegas não participaram do coro:
-É maconheiro. É maconheiro.
Hoje, só lamento que eles não fossem mais insistentes no bullying contra mim, pois talvez eu não parasse de fumar definitivamente com 18 anos de idade e sim, antes.
-Quanto aos espelhos, minha cara Arlette Mello, reporto-me a uma colega de trabalho que vivia se queixando do espelho do banheiro feminino: “já repararam como ele engorda a gente...”
Os espelhos têm um defeito: são sinceros demais, é melhor não encará-los. Isso é coisa de Narciso, cuja história não acabou bem.

-No programa Rádio Memória da Roquette Pinto em que o Sérgio Fortes se disse mais só do que Robinson Crusoé sem radinho de pilha, ele apresentou “Pedacinho do Céu”, de Waldir Azevedo sob a batuta do maestro Daniel Barenboim. Disse, então, que o maestro estava deixando a direção de uma orquestra cujo nome não chega à sua mente, no momento. Ele já se lembrou? Dieckmann.
BM: Sim, ele já se lembrou. Há menos de uma quinzena foi anunciado que o maestro renunciou às suas funções de diretor artístico do Teatro Alla Scala, de Milão, com dois anos de antecedência do término do contrato.
Para o consolo dos melômanos, foi lançado, recentemente, o “Réquiem” operístico, de Verdi, com o maestro ainda à frente da orquestra e do Coro do Teatro Alla Scalla. E melhor ainda: a TV Cultura registrou esse acontecimento e, dois sábados atrás, colocou-o na programação.
Críticos afirmam que, caso tenha sido a despedida de Daniel Barenboim, foi um adeus admirável.  Que ele não perdeu a mão, como alguns maestros, transformando uma missa fúnebre numa “maçaroca ruidosa”.
Como curiosidade, acrescentamos que o maestro Hans von Bullow, de quem Wagner levou a mulher, passando por Milão, deu uma olhada na partitura e comentou sarcasticamente: “Verdi acaba de compor mais uma ópera, ainda que travestida de caráter eclesiástico.”  Brahms, por sua vez, discordou da má vontade de Bullow e elogiou o “Réquiem”, de Verdi. O tempo mostrou quem estava certo.

-Li sobre a visita que o filósofo e escritor Albert Camus fez ao redator do Biscoito Molhado em Del Castilho. Afinal, ele era a favor da revolta e não da revolução?...  Não entendi bem. Sérgio Gay.
BM: Nada disso. Camus queria a revolução desde que ela continuasse estritamente ligada à revolta que deu luz a ela. E os exemplos na história mostravam que isso não acontecia. Tão logo os revolucionários chegavam ao poder, o motivo da revolta se diluía e eles lutavam entre si. A revolução engolia os seus próprios filhos, como se dizia no Terror, em 1793, na França.
Camus foi um espírito livre, que não se deixou prender pelo debate ideológico e hoje, ironicamente, esquerda e direita o disputam. A sua inteligência paira sobre esses maniqueísmos obsoletos.




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