--------------------------------------------
O BISCOITO MOLHADO
Edição 5169 Data: 15 de
agosto de 2015
---------------------------------------------
NO SABADOIDO
Entrei na cozinha do
Sabadoido e encontrei meu sobrinho já refestelado nas almofadas no pequeno sofá
de alvenaria. Ele estava com a bomba atômica de Nagasaki na cabeça.
-Carlão, se atirassem uma bomba atômica na sede da
prefeitura idêntica à bomba de Nagasaki, pegava do Aterro do Flamengo ao
Maracanã.
-Isso quer dizer que todo o Centro seria varrido do
mapa?
Enquanto ele meneava afirmativamente a cabeça, eu
prosseguia no meu cálculo da devastação:
-Todo o bairro de São Cristóvão também seria
derretido.
E emendei uma pergunta:
-Por que aventaram a hipótese de a bomba ser atirada
justamente na sede da prefeitura?
-Carlão, quem imaginou isso deve ter muita bronca do
Eduardo Paes.
-Parece que ele só anda pela Barra da Tijuca
acompanhando as obras do centro olímpico e, pelo que você falou, ele escaparia
vivo.
-Carlão, seria bem melhor que o Eduardo Paes fosse
igualzinho ao Sérgio Cabral quando era governador, assim, jogariam a bomba em
Paris.
-Logo em Paris, Daniel!... É verdade que muitos
companheiros do PT não escapariam, mas ainda assim, seria uma tragédia
pavorosa.
-Isso quase aconteceu, Carlão, pois o Hitler ordenou
que os nazistas se retirassem de Paris incendiando a cidade toda.
-“Paris está em chamas?” – até fizeram um filme
sobre esse caso.
Essas
palavras foram do meu irmão que acabara de engraxar mais uma vez a sua
bicicleta ergométrica que ainda cismava de incomodar os vizinhos com seus
rangidos de funkeiro rouco.
Depois,
o seu antiamericanismo, cacoete que acomete muita gente, aflorou:
-O
que os americanos fizeram foi uma barbaridade.
-Cláudio
nós temos que analisar esse fato em perspectiva. Os japoneses endeusavam o
imperador, se ele não se rendesse, os seus soldados lutariam até a morte.
-Que
lutassem, mas não jogar uma bomba atômica em Hiroshima e outra em Nagasaki.
-Cálculos
conservadores estimaram que, prosseguindo a guerra com a invasão do Japão,
seriam mais de um milhão os mortos.
-Com
as bombas, foram 200 mil. – interveio o Daniel.
-A
guerra é tão cruel que temos de fazer estatísticas macabras. – afirmei.
-O
Holocausto não matou 6 milhões? Foram, então, 30 bombas de Hiroshima e Nagasaki
que caíram sobre os judeus. - calculou o Daniel.
-Ainda
bem que os americanos chegaram à bomba atômica primeiro que os alemães, se
não... Cientistas, eles tinham, mas faltavam recursos, eles até escassearam
para a fabricação das bombas do Werner von Braun. (*)
-O
Einstein foi um dos cabeças da bomba atômica.
-Claro,
ele era o maior cientista que existia. - seguiram-se as palavras do meu
sobrinho às do pai.
-Einstein
formulou aquela equação E=MC², a energia é igual à massa vezes a velocidade da
luz elevada ao quadrado. Ele, no entanto, julgou que não trabalhariam sobre ele
fórmula para chegar a uma quantidade tão absurda de energia. Quando soube que
os alemães poderiam chegar à bomba atômica, escreveu uma carta de alerta para o
Presidente Roosevelt.
-Eu
sei, os americanos criaram o Projeto Manhattan com cientistas alemães,
inclusive, trabalhando com os aliados.
-Hitler
tomou como inimigos os judeus e eles, que são inteligentes ao extremo,
naturalmente, fariam de tudo para derrota-lo. – comentei.
Sem
se desconectar da conversa, meu sobrinho acessou o seu smartphone e leu:
-Einstein
disse, dois pontos, abre aspas: “Se a minha Teoria da Relatividade estiver
correta, a Alemanha dirá que sou alemão e a França me declarará cidadão do
mundo. Mas se não estiver, a França dirá que sou alemão e os alemães dirão que
sou judeu”. Fecha aspas.
Em
seguida, tirou as vistas do smartphone e se voltou para nós.
-A
Teoria da Relatividade está correta e, no entanto, os alemães consideraram Einstein
judeu.
-Ele
nunca imaginaria que o povo alemão se tornaria presa dos instintos mais
primitivos sob a liderança do lunático do Hitler. - disse-lhe.
-Eu
conhecia essa frase do Einstein, mas não sabia dizer de cor, palavra por
palavra, também porque me parece que ele também falou da hipótese de a Teoria
estiver incorreta, que os franceses diriam, então, que ele era suíço.
-Velho,
o Google está à mão para tirar essas dúvidas.
-O
Google é ótimo, mas não deve ser seguido como uma bíblia infalível. Já topei com inúmeros erros, entre eles,
atribuir uma frase de Pascal a Voltaire. A Rosa Grieco, que tem 80 anos de
leitora, deu a Pascal o que era de Pascal e a Voltaire o que era de Voltaire.
O
assunto do nosso diálogo começou a se desgarrar.
-Falando
em Google, eu assisti, num desses canais abertos, a uma palestra muito
interessante do João Ubaldo Ribeiro em que ele alude ao Google.
-Nas
crônicas deles de domingo no Globo, ele escrevia que não se entendia com os
computadores que, em matéria de tecnologia, ele nunca foi além do
liquidificador de duas rotações. - lembrou meu irmão.
-Com
o convívio diário com o computador, eles foram se entendendo.
-Sim,
o computador é diferente da esposa. - fustigou o Claudio.
-Nessa
palestra, ele diz que suava para descobrir, nos livros, nomes de peixes de rio
de que ele não se lembrava mais, no entanto, com o Google, ele vê a sua frente
uma relação enorme de peixes fluviais.
-O
que ele disse de interessante, Carlão? – indagou-me o Daniel que não estava
muito interessado em nomes de peixes de rio ou de mar.
-Ele
falou que não acredita em inspiração, nesse negócio de esperar pelas musas.
Villa Lobos era assim, dizia que se sentava e se punha a compor como se fosse
uma obrigação. Beethoven despejava uma jarra d’ água na cabeça, sacudia as
melenas, como os cachorros que saíram do banho, e escrevia nos pentagramas.
-E
o João Ubaldo Ribeiro, Carlinhos?- quis saber o Claudio.
-Ele
disse que é disciplinado, que se impunha escrever mais do que um G.G. por dia,
menos do que uma VW. Sua meta era um J.C.
-G.G.
é o que, Carlão? Modelo de roupa para
gordo?
-É
claro que ele explicou o significado dessas letras. – deduziu meu irmão.
-Ele
esclareceu que um G.G. significa Graham Greene, que escrevia 600 palavras por
dia; um J.C, Joseph Conrad, que redigia 900 palavras; uma V.W, Virgínia Wolf,
que chegava a 1200 palavras diárias.
-Ele
escrevia, então, 900 palavras diariamente. – disse o Claudio.
-Você
acha muito, Carlão?
-Daniel,
o N.R. , Nélson Rodrigues, deveria escrever umas 2000 palavras diariamente,
pois a sua obra é extensa, só as peças de teatro são 17. “A Vida Como Ela É”,
mais 1500, por aí vai, e ele morreu com apenas 68 anos de idade.
-Você
lê esses articulistas de jornal escrevendo que ficarão fora um mês por causa
das férias, e o Nélson Rodrigues, que eu saiba, nunca tirou férias; os seus
textos jornalísticos só não saíram quando ele morreu. – observou meu irmão.
-Os
escritores de hoje vão a feiras de literatura na Alemanha, na França, sei lá
aonde mais, às expensas do governo. Isso não acontecia com o Nélson, com o Millôr.
– assinalei.
-Você
viu agora, Carlinhos, a Lillian Witte Fibe metendo o pau na política econômica
do governo Dilma no programa do Jô Soares? Ele tratou de interrompê-la para
pedir os comerciais? – indagou-me o Claudio.
-Carlão,
ele tem o rabo gordo preso.
-Concordo,
Daniel.
(*) O von
Braun era especialista em foguetes, não em bombas, fossem atômicas, ou
polvorentas. Não que isto seja uma atenuante, pois aos habitantes de Londres
pouco interessaria saber se as V-1 e V-2 eram devidas a especialistas em
explosivos, ou em balística, trata-se apenas de colocar o pingo no i certo. Ou,
como diria o próprio redator do seu O BISCOITO MOLHADO, a Pascal o que era de
Pascal e a Voltaire o que era de Voltaire.
Nenhum comentário:
Postar um comentário