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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5163 Data: 04 de
agosto de 2015
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SABADOIDO
2ª PARTE
Depois de pegar mais uma latinha de
graxa, Claudio retornou à sua faina; eu e o Daniel voltamos a ser os únicos na
cozinha do Sabadoido.
-Então, Daniel, você não dormiu muito
tarde porque os filmes da televisão eram ruins?
-Um documentário sobre o afundamento do
Titanic foi interessante e eu assisti a ele.
-Falando
nisso, Daniel, o humorista Zé Simão disse que, com a crise econômica, um
prostíbulo desses por aí passou a se chamar “Putanic”.
-Essa piada nem precisa da claque
composta pelo Ricardo Boechat e pela Tatiana Vasconcelos.
-E pelo José Simon, porque ele faz
claque de si mesmo. - acrescentou.
-Voltando ao Titanic...
-Não dá mais para voltar, ele afundou.
Você não soube, Carlão?
-Sem brincadeiras, Daniel.
-Esse documentário a que me refiro,
fala da embarcação que estava mais próxima do Titanic: o SS Californian, um
navio a vapor britânico.
-Bem, Daniel, eu assisti a dois filmes
sobre essa catástrofe: “Somente Deus Por Testemunha” e “Titanic”.
-Desses dois, eu vi “Titanic”.
Estávamos até juntos num cinema do Nova América. “Somente Deus Por Testemunha”
como é?...
-Eu me recordo que vi no Cine Cachambi,
lá por 1960. Do filme, propriamente dito, só lembro que ele afunda no final.
-Não era, então, uma versão dos
Estúdios da Disney, pois eles fizeram que o Corcunda de Notre Dame não morresse
no fim da história. - aproveitou a piada.
-Bem, mesmo que os Estúdios da Disney
fizessem um desenho sobre a viagem do “Titanic”, seria impossível que a
história não terminasse com o naufrágio.
-Impossível, nada, Carlão: bastaria uma
comunicação com o SS Californian que a tragédia seria evitada.
-Lembrei-me de mais uma cena de
“Somente Deus Por Testemunha”.
-Qual?
-Enquanto os milionários almoçavam ou
jantavam, um deles colocou um lápis em pé sobre uma das mesas e disse: “Este
navio é tão seguro, que o lápis não cai.”
-Cairia depois.
-Como eu dizia, Daniel, assisti a dois
filmes, mas, se a memória não me trai, não há referência alguma ao SS
Californian.
-O “Californian” era um navio a vapor
britânico, como eu disse, que transportava algodão, mas podia, também, levar 47
passageiros e 55 tripulantes.
-Era a embarcação mais próxima do
Titanic? - interrompi.
-Era; ele saiu de Londres para Boston,
no dia 5 de abril de 1912, sem passageiros, sob as ordens do Capitão Stanley.
-Daniel, como você guardou tudo isso na
cabeça? Até parece “Funes, o Memorioso”, personagem do Jorge Luís Borges.
-Carlão, eu já disse uma coisa, com
esta cozinha repleta, e repito agora: eu tenho a melhor memória da família.
Quanto à memória RAM, eu nem discuto.
Mas no que diz respeito à memória HD, o buraco é mais embaixo.
-Buraco você vai ver se me deixar
prosseguir.
-Prossiga, Daniel, o memorioso.
-Um dia antes do naufrágio, ou seja, 14
de abril, um domingo, o operador do telégrafo do “Californian” relatou três
grandes icebergs que distavam 24 quilômetros ao norte do curso e era para lá
que o “Titanic” se dirigia. O operador recebeu o aviso e, perto das 10 horas e
meia da noite, deu conhecimento ao capitão.
-Como era mesmo o nome dele, Daniel?
-Capitão Stanley.
-Ele mandou parar o navio?
-Por enquanto, não. Mas quando estavam
ao sul do Grand Banks de Newfoundland, encontraram um grande campo de gelo. A
sorte é que o capitão percebeu. Não havia como sair dali, eram icebergs por
todos os lados, o Capitão Stanley, mandou, então, que se parasse o navio e se
aguardasse a manhã para tentar sair daquela cilada.
-Ou seja, Daniel, ele já estava
prevenido, por isso o navio vinha devagar e houve tempo para evitar a tragédia.
Qual era a velocidade do “Titanic”?
-Em nós, eu não sei, em quilômetros,
40.
-40 quilômetros é alta velocidade,
Daniel.
-Com o navio parado, o Capitão Stanley
foi à cabine do operador do telégrafo e perguntou se havia algum navio nas
proximidades.
-O “Titanic”. - antecipei-me.
-Ele pediu ao telegrafista que
comunicassem ao “Titanic” que eles haviam parado por causa do campo de gelo.
-Não conseguiu?
-Carlão, calma que eu vou chegar lá.
-Chegue, memorioso.
-Quem era o operador de telégrafo do
“Titanic”? Jack Phillips. Quando o telegrafista do “Californian” enviou a
mensagem para o Jack Phillips, este estava ocupado com uma estação de rádio em
Newfoundland.
-Que coisa! - exclamei.
Assim, as vozes chegaram aos ouvidos de
Jack Phillips misturadas que, irritado com a confusão, gritou: “Cala a boca que
eu estou ocupado”.
-Você não disse o nome do operador de
telégrafo do Titanic?
-Evans.
-O que fez o Evans depois desse
passa-fora?
-Evans desligou o telégrafo e foi
dormir. Eram onze e meia da noite.
-Minutos depois, o “Titanic”, que vinha
velocíssimo, para um transatlântico, bateu num iceberg. - disse-lhe isso e
emendei uma pergunta:
-E depois, Daniel?
-Carlão, o “Titanic” sinalizou, logo
depois da batida e da meia-noite, pedindo socorro, e nada.
-No “SS Californian”, todo o mundo
dormia?
-Por volta das 2 horas da manhã, o
capitão do “Californian”...
Fez as reticências para me testar:
-Como é o nome dele?
-O bom de memória RAM, aqui, é você.
Ainda assim, arrisquei:
-Stan Laurel.
-Stanley.
Ah, sim; Stan Laurel é o magro da dupla
“O Gordo e o Magro”. Eu sou o Hortelino Troca-Nomes.
-O Capitão Stanley, por volta das 2
horas da manhã, foi informado que foguetes brancos foram vistos. Ele perguntou
qual era a cor, responderam que era branca e ele ficou sossegado.
-Por que?
-Porque a cor do foguete que representa
pedido de socorro é vermelha. Acontece que não havia foguetes de cor vermelha
no “Titanic”.
-Poxa, o maior e mais luxuoso
transatlântico do mundo não levava foguetes vermelhos. Houve muita prepotência mesmo.
- comentei.
-20 minutos depois, ou seja, duas horas
e vinte minutos da manhã, o “Titanic” naufragou.
-Puxa!
-O Capitão se levantou às 4 e meia da
manhã, acordou o telegrafista para saber o porquê dos tais foguetes. Quando o
rádio foi ligado, souberam da tragédia. Ele ordenou que o “Californian” rumasse
para lá. Na frente, ia o navio de resgate Carpathia. Depois de pegar o último
bote de sobreviventes, o Carpathia partiu e deixou a área para o “Californian”
prosseguir no resgate.
-Sim, Daniel.
-Quando o “SS Californian” chegou só
encontrou destroços e botes vazios.
-Daria um filme só sobre o “SS
Californian”; pelo menos, deu um documentário.
Daniel continuou:
-Em 1915, o “SS Californian” foi
afundado por um submarino alemão, no Mediterrâneo, na Primeira Guerra Mundial.
-Então, daria um bom filme, Daniel.
-Com Leonardo DiCaprio no papel do
telegrafista dorminhoco.- arrematou.
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