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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5145 Data: 13 de
julho de 2015
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SABADOIDO
Depois de meses, encontro a frente da
casa, onde se realiza o Sabadoido, sem tapumes. Tamparam os buracos da calçada
e a revestiram, às pressas, com concreto, pois eram visíveis os remendos.
Quando me aproximei do portão, vi inúmeros galhos da árvore, que antes se
estendiam dos fios da rua ao telhado da casa. No meio deles, agora cortados, no
chão, estava o Claudio com um facão que, ao me ver, poupou-me de gritar seu
nome.
-Entre. Há três horas que estou podando
isto.
-Está ensaiando para ir à Amazônia e
contribuir na devastação da selva?
-Sim, para depois, quando liberarem o
uso da maconha no Brasil, plantar. - disse-me entrando no espírito da
brincadeira.
-Já entregaram o jornal e o Daniel está
lá dentro.
Deixei-o na sua faina e rumei para a
cozinha. Lá estava o Daniel, vestido com o moleton verde de dormir.
-Carlão, comemorou o primeiro
aniversário da derrota do Brasil para a Alemanha na terça-feira?
-Você sabe, Daniel, que a Sport TV reprisou
todo o jogo nesse dia?
-Assistiu a ele todo?
-Com o controle remoto na mão...
Desviei o fluxo da minha resposta para
fazer uma observação:
-Você sabe que o controle remoto é tão
importante que, num filme do Woody Allen, ele diz que mandava em casa, mas o
controle remoto ficava com a mulher, ou seja, ela, de fato, é quem mandava.
-Carlão, você assistiu à reprise?
-Como eu dizia, eu zapeava pelos canais
da televisão quando topei com o vídeo-tape. A partida já estava no final, mas
deu para ver o Ozil perdendo o oitavo gol, para, no contra-ataque, o Oscar
fazer o gol de honra.
-Carlão, num placar de 7 a 1, não
existe gol de honra.
-Na crônica do Tostão desta semana, ele
escreveu que a estratégia do Felipão era pressionar os alemães com uma linha de
três atacantes, Bernard, Fred e Hulk, com o Oscar perto dos três e mais o apoio
dos laterais, ficando o Luís Gustavo mais atrás para fazer a cobertura. Assim,
assinalou o Tostão, o Fernandinho ficou entre três alemães, porque o Felipão,
com a sua empáfia, previu que eles iam tremer contra o Brasil e ficariam na
defesa.
-Felipão é um gênio. - imitou o Daniel
os trejeitos do Miguel Falabella nos esquetes de teatro e de televisão em que
atua.
-E você e o seu pai criticando o
Fernandinho todas as vezes em que falamos desse jogo...
Meu sobrinho reagiu prontamente.
-Carlão, depois da Copa do Mundo, você
reviu os sete gols da Alemanha?
-Esporadicamente um e outro gol.
-Eu tenho todos eles aqui no meu
celular com a transmissão do Galvão Bueno.
-Com o Galvão Bueno?!...
-Nada é perfeito, Carlão.
Logo, na pequena tela do seu celular,
porém com uma notável nitidez, ele me mostrou os sete gols em sequência.
-Num deles, pelo menos, o Fernandinho
falhou feio. - reconheci.
-Talvez, com um jogador melhor no lugar
dele, a derrota não seria tão acachapante, digamos uns 5 a 1. - pilheriou.
-Carlinhos, você está com a sacola das
tangerinas? - era a Gina.
Depois de eu confirmar, ela lamentou a
probabilidade de eu voltar para casa a pé carregando o peso das frutas taludas.
-A filha da Roberta está vomitando e
ela pensa em levá-la ao hospital, o Daniel com o carro dele vai dar o apoio
logístico.
Enquanto minha cunhada falava, meu
sobrinho mostrava, noWhats App o retrato da menina, de sete anos, deitada na cama enquanto tomava soro.
-Ela está internada no Pronto Baby da Rua
Silva Rabelo. - informou o Daniel.
Lembrei da filha da minha sobrinha, um
ano mais nova, que entrou no soro, porque vomitava muito, umas três vezes.
-Ela chegava da rua e não lavava a mão.
A causa foi essa.
-Qualquer saidinha que eu der, eu lavo
as mãos. Se eu for na esquina, quando volto, lavo as mãos.- enfatizou.
-Você, então, Gina, é como aquele
personagem do Dias Gomes, o Jovelino Sabonete, que sofria de TOC.
-Digamos, Carlinhos, que estou entre
Pôncio Pilatos e o Jovelino Sabonete.
-Carlão, aquele assassinato no metrô
foi no seu horário?
-Foi no meu horário de almoço, Daniel.
-Mas você passa pela estação da
Uruguaiana.
-Pois é, Gina; na hora em que retorno
do trabalho, a estação da Uruguaiana é a que mais recebe passageiros. Ontem,
estranhei quando vi pouquíssimos passageiros na plataforma, no vagão onde eu
estava não entrou ninguém, o normal são uns quinze passageiros. Duas moças, que
seguravam o mesmo balaústre do que eu, passaram a ler uma mensagem no Whats App
de uma delas e eu ouvi comentarem que a estação ficara fechada por três horas.
-Foi isso mesmo. - confirmou a Gina.
-Como não consegui escutar mais nada,
julguei que o problema fosse mais uma batida da Polícia Civil no camelódromo,
onde há inúmeras irregularidades, até remédio de tarja preta eles vendem.
-Certamente remédio falsificado no
Paraguai. - disse ela.
-Assistindo em casa ao noticiário da
televisão, soube de fato o que ocorrera: assassinaram, na bilheteria, um
cidadão que carregava um pacote de dinheiro da empresa em que trabalhava.
-Essa empresa é aqui no Méier. - deixou
o Daniel o seu instagram de lado, interessando-se pelo assunto.
Prossegui:
-Vi, então, na TV, uma multidão de
curiosos contidos pela polícia.
-Eu não posso criticar porque também
sou curiosa, até abalroamento de carrocinha da Kibon eu corro para ver.
-Então, aparece um sujeito, senta em um
degrau da estação e chora copiosamente.
-Logo veio um repórter e quase enfia o
microfone na boca dele perguntando se é amigo da vítima.
-Não deixam nem a pessoa sofrer em paz.
- seguiram-se as minhas palavras às da Gina.
-E ele respondeu alguma coisa? - quis
saber o Daniel.
-Ele chorava muito para dizer alguma
coisa. - respondeu a Gina.
Nesse instante, surgiu, suado, na
cozinha o Claudio; buscava um copo d' água.
-E o seu ajudante?- perguntou-lhe a
Gina.
-Quando eu terminar de cortar o último
galho, aí é que o Carlinhos vai aparecer.
-Mas o Carlinhos está aqui, apontou-me
o Daniel.
-O que é isso, você sempre me chamou de
Carlão. Estou fora desse bolo. - defendi-me.
-Vou tirar esse macacão e me vestir
para ficar de prontidão.- disse o Daniel rumando para o seu quarto.
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Esta edição é uma homenagem ao Vagner,
um dos fundadores do Sabadoido. R.I.P.
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