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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5243 Data: 30 de novembro de 2015
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SABADOIDO
-Claudio, sonhei com a
Dilma.
-Erótico?...
-Eu falei sonho, não
pesadelo.
-Como foi esse sonho.
-Havia várias pessoas
sentadas, ao céu aberto, num local gramado e ela ia falar.
-Isso acontece muito nos
Estados Unidos; é o que se vê nos filmes. - disse ele.
-Havia muita lama...
-A lama da Samarco. -
interrompeu-me.
-Depois de eu contar, você
procure decifrar.
E prossegui:
-Os sapatos dela estavam imundos,
pareciam os do Mujica do Uruguai, mas só os sapatos. Eu, então, lhe ofereci o
meu tênis para ela calçar. Ela segurou o meu tênis pelos cadarços, enquanto me
olhava com uma expressão de repugnância. O mais marcante, desse meu sonho, foi
a sua cara de asco, de desprezo, sei lá de quê mais?
-Isso é verdade, Carlinhos?
-Claudio, se eu fizesse
análise, contaria, com essas mesmas palavras, este sonho ao psicanalista.
-Bem, Carlinhos, Freud faria
uma relação do seu tênis com o pênis.
-Sem brincadeiras, Claudio;
ele era austríaco e na língua alemã as palavras pênis e tênis não soam
parecidas, julgo eu, pois nunca estudei essa língua.
-Carlinhos, você assistiu a
“Um Método Perigoso” no Telecine Cult?
-Vi há oito meses, mais ou
menos; na semana passada, aproveitei uma reprise e revi.
-O Jung, quando se
encontrava com o Freud, narrava os seus sonhos e ele analisava, e vice-versa.
-Sim, Claudio, mas houve um
sonho do Freud que ele só insinuou para o Jung, não contou “porque isso
acabaria com a minha autoridade” - foi a desculpa dele. Eles já estavam à beira
da ruptura.
-Como você disse que reviu,
na semana passada, pode me contar do que se tratava mesmo o filme? Nem me
lembro mais.
-Jung cuida de uma neurótica
russa, filha de um milionário judeu, que a espancava, quando criança. O
problema dela é que sentia prazer nesses espancamentos e cresceu com esse
problema. Jung a cura, com o método de Freud e ela se tornaria também
psicanalista.
-Lembro-me bem, Carlinhos,
que o Jung faz sexo com ela sempre dando-lhe umas bordoadas para ela chegar ao
orgasmo.
Sem tomar fôlego, continuou:
-Lembra o Valter, aquele
vizinho que morava naquela casa entre a nossa e a das três irmãs piranhas?
-Claro; ele era o Lando
Buzanca da Chaves Pinheiro.
-Ele tinha uma namorada em
que batia com vontade. Ela berrava tanto que, certa vez, o motorista do
Méier-Maria da Graça parou no ponto, em frente à casa do Adalberto, para ouvir,
com os passageiros, a gritaria da mulher.
-E esse ônibus, Claudio,
estava a uns cinquenta metros do local do “crime”.
-Com uma boa acústica, quem
estivesse a cem metros, escutava. - observou.
-Por volta das 7h 30min da
manhã, eu varria e lavava a varanda e o quintal da nossa casa. Sempre, Claudio,
nos dias seguintes a esses espancamentos, os dois saíam para trabalhar de mãos
dadas como dois pombinhos.
-Essa mulher, Carlinhos, devia
ser igual àquela do Jung.
-Não era não; essa da Chaves
Pinheiro era muito mais neurótica. Jung era sofisticado, dava umas taponas nas
ancas da “paciente” e não passava disso. A namorada do Valter pedia porrada
mesmo, aquelas de deixar as mãos ardendo.
-O Nélson Rodrigues dizia
que mulher gosta de apanhar, Carlinhos.
-Em meados dos anos 60, numa
entrevista, perguntaram ao Nélson Rodrigues se era verdade que mulher gosta de
apanhar, ele confirmou. “Só as neuróticas reagem” - acrescentou.
-É o contrário. - observou
meu irmão.
-A mulher do Pedro Paulo,
candidato do Eduardo Paes a prefeito em 2016, reagiu.
-E perdeu um dente. - disse
ele.
-Agora, Claudio, ela vir de
São Paulo até o Rio de Janeiro, com o atual marido, para dar uma entrevista
junto ao espancador e dizer que a imprensa está fazendo da vida dela um
inferno... Eu não diria que ela gostou de apanhar, tanto que, na ocasião, fez
queixa na polícia. Não há sexo por trás disso, é outra coisa.
-Freud e Jung passam longe
dessa história.
-Passam. - concordei.
-Essa paciente do Jung
escreve para o Freud tratar dela, não foi?
-Jung discordava que o sexo
fosse o motor do nosso comportamento, por isso, rompeu com o seu mestre, mas
Freud, ao contrário do Jung, nem tocou nela.
-Não deixa de ser irônico.
-Ela se tornou psicanalista,
dizem até que a pulsão da morte atribuída a Freud foi concebida por ela e
morreu, anos depois, fuzilada pelos nazistas.
-O filme diz isso no texto
que corre pela tela no final.
-Mudando de assunto,
Claudio, mas não totalmente, dando uma olhada no calendário que o Sérgio Fortes
lê, aos domingos, no Rádio Memória, vi que a segunda esposa do escritor Norman
Mailer, Adele Morales, que era artista plástica, morreu no dia 22 de novembro
deste ano com 90 anos de idade.
-Mudou inteiramente de assunto.
- criticou.
-Não mudei, porque, numa
festa, o Norman Mailer não só bateu na mulher como a esfaqueou.
-Quantas histórias para a
redação deste ano do ENEM: “Violência contra a mulher”. - comentou.
-Sabe por que ele enfiou a
faca na mulher, Claudio? Porque ela disse que Dostoievski era mais escritor do
que ele.
-Ele, então, vai esfaquear
todas as mulheres do mundo. - ironizou.
-Norman Mailer andava
empolgado com o sucesso alcançado pelo seu livro “Os Nus e os Mortos”, que
escreveu com 25 anos de idade. Mais do que isso, ele já havia bebido alguns
litros de uísque, a sua mulher também...
-Mas ela estava bem mais
sóbria do que ele. - acentuou.
-Claro. - concordei.
E prossegui:
-Era um casal de festas e
porres homéricos, e acabou mal.
-Veja: o Norman Mailer
morreu, se não me engano, com 85 anos, e ela, você disse, agora, chegou aos 90.
Então, essa história de viver comedidamente, com dietas ... muita gente, vive
assim, e morre jovem.
-Sim, Claudio, mas você
argumenta com a exceção, não com a regra.
-O Zanela (ele sempre cita o
colega de trabalho do seu sogro nessa hora) fumava como uma chaminé e bebia
como um gambá, e chegou aos 90 anos de idade como essa dona de que você falou.
Ouvimos ruídos: eram o Daniel
e a Gina voltando do consultório do dentista.
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