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segunda-feira, 23 de março de 2015

2817 - o monarca do samba


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5067                                   Data:  17 de março de 2015

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A DUPLA DINÂMICA DE VOLTA

PARTE II

 

Encerrado o calendário do dia 15 de março, Jonas Vieira anunciou uma homenagem à Portela e ao Monarco, seu amigo querido, “um dos cobrões da Velha Guarda”. Os dois apresentadores, antes da primeira gravação, revelaram que a Portela era a sua paixão e que, no desfile deste ano, a águia só faltou falar, porque voar ela voou. Concordaram que foi injustiçada pelos jurados e fizeram menção a um ressentimento por ela ter ganhado tantos títulos, embora o Jonas Vieira reconhecesse que o presidente da escola, Natal, em anos pretéritos, “pegou pesado”.

Foi anunciado o samba “Quantas Lágrimas”, de Manacéa da Velha Guarda da Portela, que logo passamos a ouvir.

Monarco chegou com uma gravação de atraso, sendo louvado pelo seu bom estado físico, embora octogenário. Sérgio Fortes se apresentou a ele (já não se conheciam?) como “Sérgio Fortes, defensor dos fortes e dos opressores”.

-Melhor do que defensor dos frascos e dos comprimidos. - deveria ter pensado o Dieckmann, no seu Jaguar, rumo ao Posto 5 de Copacabana com a Branca.

Renovados os louvores ao desfile da Portela com a presença do ilustre convidado, Jonas Vieira anunciou a segunda gravação: “Poeta Apaixonado”, de Monarco e Mário Lago.

Da música para a conversação.

-Monarco, há quanto tempo você está na Portela?

Ele respondeu que desde 1947, quando veio de Nova Iguaçu com 13 para 14 anos ressaltando que, na época, a escola foi campeã por sete vezes consecutivas.

-Trabalhei na ABI, o doutor Moses (Herbert Moses) me mandou embora; depois me arrumou um emprego com o Vicente Lima no “Lux Jornal” (ele era fundador e irmão de Alberto Lima, diretor por mais de 30 anos desse jornal).

-Aquele que trazia recortes de jornais? - quis saber o Sérgio Fortes.

Depois de confirmar, Monarco voltou ao seu tempo de ABI, e falou do jornalista Paulo Magalhães que o chamava de Ademar de Barros por causa da sonoridade com o seu nome verdadeiro: Ildemar.

-O doutor Moses dizia: “Esse menino me deixou de cabelos brancos.”

Narrou, em seguida, da colaboração que deu às cãs do presidente da ABI.

-Eu peguei uma toalha e uma vassoura, e o Tupi, uma lata. Tupi era um escurinho, Tupinambá, trabalhava como engraxate. Havia uma barbearia, na ABI que está lá até hoje, e uma cadeira de engraxate. Tupi engraxou muitas vezes as botas do Villa Lobos. Não tinha ninguém, as salas de estar só abriam às 2 horas, e nós fizemos a nossa farra. Abriu a porta do elevador silenciosamente, ela só fazia barulho quando fechava, e apareceu o doutor Moses com o presidente dos Estados Unidos, o Truman; ele mostrava as dependências da ABI.

-Rapaz! - espantaram-se o Jonas Vieira e o Sérgio Fortes.

Enquanto o Monarco evoluía de toalha e vassoura, seu amigo de estripulias gaguejava:

-O doutor Moses... Eu olhei, e ele estava com uma cara amarrada.- alongou bem as vogais de “amarrada” para nos dar uma ideia da indignação do seu chefe.

- Quinze dias depois, fui chamado e me mandaram embora. O Paulo Guimarães preocupado comigo: “O que a gente faz com o Ademar de Barros?...”

Deram um jeito, e o Ademar de Barros, no caso, o Monarco, foi levado para o “Lux Jornal”, periódico que se destacava pelos “clippings”, como se diz no jornalismo americano.

Empolgado, Jonas Vieira interveio.

-Essa história me lembra de uma que o César de Alencar me contou. Ele começou na Rádio Nacional num programa noturno. Como fazia muito calor, e não havia ninguém, ele ficou pelado. Quem aparece?... Renato Murce, o diretor, com uma trupe. No dia seguinte, quando reclamaram dele, o César disse: “não me avisaram antes; até que eu estava meio vestido”.

Depois desses causos, chegou a vez da música, e ouvimos “Levanta Cedo”, de mestre Rufino com Monarco e a Velha Guarda da Portela.

-Trabalho extraordinário do Paulinho da Viola. - salientou o Jonas Vieira.

Faltava uma história do Sérgio Fortes e ele não nos decepcionou. Aludiu à época em que as partidas do campeonato carioca eram disputadas nos estádios dos clubes participantes, em 1964, precisamente.

-O Fluminense jogava contra o Madureira, na Rua Álvares Chaves, fez 1 a 0, mas o Madureira empatou. Havia uma dupla de área que infernizou a defesa do Fluminense, Batata e Peixe Galo; nunca vou me esquecer desses dois. Quem estava na tribuna de honra?... Natal.

-Natal era Fluminense. - acrescentou o Monarco.

-Ele, na tribuna de honra, de pé, parecia um lord inglês. Era uma figura impressionante.

Entrou mais uma gravação, “Tristonha Saudade”, de Monarco, cantando em duo com a botafoguense Beth Carvalho.

Depois da crônica do Fernando Milfont, na locução do José Maurício, Jonas Vieira disse para o Monarco que o conhecia desde os velhos carnavais.

-Eu tenho um jornal lá em casa, guardado, “A Notícia”, em que você escreveu “Monarco, a cadência bonita do samba”.

-Exatamente.

-Havia “O Dia” e “A Notícia”. - rememorou o sambista.

-Eu não sabia quem era, mas havia um crítico importante de música clássica em “A Notícia”. - interveio o Sérgio Fortes. Era um belo jornal.

-Eu trabalhei em muitos jornais, um deles foi “A Notícia”, e lá, eu fiz muita matéria com o pessoal da música.

-Sei... sei... sei... - intervinha o Sérgio Fortes na fala do seu parceiro.

-O primeiro trabalho do João Nogueira fui eu que promovi. Outro trabalho que fiz, o da Elza Soares com o Garrincha, quando ela morava num casarão na Lagoa; entre outras figuras.

Foi interrompido pelo Sérgio:

-Jonas, “A Notícia” tinha capa colorida?

-Não me lembro mais.

-Tinha um jornal colorido...

-A “Última Hora”. - afirmou o Monarco.

-Tinha um jornal que era verde e claro... - insistiu o Sérgio Fortes em explorar a experiência jornalística daqueles dois veteranos.

-O verde e claro não era “A Notícia”. - disse o Jonas.

-”A Notícia” era normal e vespertino. - acrescentou o Monarco.

-”O Dia” de manhã, e “A Notícia”, a tarde; ambos do Chagas Freitas. Ele comprou os dois jornais: “O Dia” para explorar a criminalidade.

E prosseguiu o titular do Rádio Memória:

 -O crime, naquela época... eram mais de quinze jornais e os principais , o Globo, o Diário de Notícias, o Correio da Manhã não davam uma nota de criminalidade na primeira página; hoje, o Globo estampa o que há de pior da criminalidade. Naquela época, o Dia era considerado o jornal de sangue.

Sérgio Fortes interrompeu a digressão do Jonas Vieira para citar a “Luta Democrática” do Tenório Cavalcante.

-O pessoal dizia: se espremer sai sangue.

Monarco fez a intervenção acima e continuou com as reminiscências.

-Havia um jornalzinho que eu gostava “A Gazeta de Notícias”, ficava na Rua Teófilo Otoni. Eu levava correspondência para lá quando trabalhava na ABI, depois das 2 horas da tarde. Na portaria, eles me davam a Gazeta de Notícias.

E seguiu adiante:

- Tinha ”O Jornal”, tinha “A Democracia” na Rua do Lavradio. Tudo acabou. Tinha um jornal comunista que ficava na Rua Silva Jardim. Eu cheguei lá, uma vez, e o pau estava comendo; a polícia estava lá.

Aludiu à frase do Barão de Itararé “Entre sem bater” colocada na portaria do “Diário do Povo” quando ele foi sequestrado e agredido por oficiais da Marinha por causa da publicação, em fascículos, da história do marinheiro João Cândido. Monarco citou o jornalista Pedro Motta Lima, que trabalhou com o Barão de Itararé, houve apartes e uma pequena confusão se formou:

-Eu estou falando da Tribuna da Imprensa. - disse o Jonas.

-Eu me refiro à Tribuna Popular do Pedro Motta Lima. - esclareceu o compositor.

-A Tribuna da Imprensa era do Carlos Lacerda.

-O Dia não foi do Ademar de Barros? - indagou o Sérgio.

-O Dia e a Notícia eram dele, o Chagas Freitas comprou os dois jornais. - disse o Jonas Vieira.

-O controle mudou e ficou proibido para menores de 18 anos. - não perdeu a piada o Sérgio Fortes.

Os três relacionaram os nomes de todos os jornais que lhes vinham à mente, até o Jonas Vieira concluir:

-O mercado de trabalho era imenso.

Um adendo do Biscoito Molhado: o mercado de trabalho era imenso, mas a vida do jornalista era dura. O meu pai trabalhou no Informador, na Vanguarda, no Diário de Notícias, entre outras publicações, e eu me lembro dos constantes atrasos de salário, de pagamentos através de vales e até de recebimento de aparelhos elétricos em vez de dinheiro. Mas o Jonas Vieira aludiu aos seus colegas que tinham de trabalhar num jornal de dia e em outro de noite (Será que ele conheceu o meu pai?)

Monarco se manifestou porque lhe saiu da memória mais um jornal:

-Diário Carioca do Danton Jobim.

-O Stanislaw Ponte Preta começou lá. - informou o Jonas.

Sérgio Fortes citou o Jornal dos Sports, a sua cor de rosa e seu proprietário, Mário Filho, irmão do Nélson Rodrigues.

Jonas Vieira contou mais um causo, agora relacionado a um jornalista que trabalhava, ao mesmo tempo, num jornal e na revista “O Cruzeiro”. O meu pai, aliás, falava de um colega seu que trabalhava tanto que diziam que, ao pegar o bonde para casa, ele fazia o trabalho do trocador.

-Essas coisas dos jornais são extraordinárias. - afirmou, saudoso, o Jonas Vieira com a concordância de todos.

Após a lembrança de ter trabalhado com o Sérgio Cabral no Diário da Noite, voltou para a música e anunciou a Velha Guarda da Portela cantando, de Heitor dos Prazeres e João da Gente, “A Tristeza me persegue”.

Monarco fez referência à voz de João da Gente, que ele prescindia de microfone para cantar, e da grande admiração do Carlola, que compareceu ao seu enterro, pelo cantor.

Seguiram-se “Estação Primaveril”, de Monarco e Quininho, com a participação da Marisa Monte; “Passado de Glória”, samba do Monarco sobre a Portela, na voz de Jair do Cavaquinho.

O Rádio Memória se encerrou musicalmente com o primeiro samba composto por Monarco “Crioulinho Sabu” , que o deixa orgulhoso do filho, que elaborou o arranjo com vozes infantis.

Um demorado abraço.

 

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