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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5058 Data: 02 de
março de 2015
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HENRY MANCINI NOS 450 ANOS DO RIO DE JANEIRO
Sérgio Fortes saiu de Copacabana rumo à
emissora com a piada no bolso do colete. Bastava o Jonas Vieira se referir ao
aniversário da cidade, o que seria inevitável, pois o programa caía bem no dia
1º de março, e ele a soltaria.
-Bom dia, ouvintes da Rádio Roquette
Pinto do Rio de Janeiro, 94.1, aqui estamos nós, hoje, exatamente no dia em que
o Rio comemora 450 anos, uma cidade fantástica, extraordinária pela qual eu
tenho a maior paixão. O que você pensa disso, Sérgio?
-São 450 anos com corpinho de 300.
Pronto, o humor estava garantido para
aquele domingo; Sérgio Fortes poderia falar, agora, só em tragédias, como a
atual situação econômica do Brasil, porque já dera a sua parcela à descontração
do programa.
Depois das saudações dos dois
apresentadores aos cariocas, nascidos cá ou não, indagou do Sérgio Fortes o que
havia além do Rio. Este imaginou, como todos nós, que era a hora do calendário,
mas foi inesperadamente interrompido:
-Vamos fazer o seguinte: vou colocar a
primeira gravação no ar, depois você vem com o calendário.
Levei as mãos à cabeça.
-”Cidade Maravilhosa, não!...”
Eu estava rotundamente enganado; o discotecário
era o Simon Khoury e nós ouvimos uma composição de Duke Ellington na leitura de
Henry Mancini, que apeteceu a todos.
O Homem-Calendário ainda esperou um
minuto, porque o Simon Khoury tinha uma dúvida.
-Antigamente, quando se falava em
banda, era uma orquestra: metais, flautas, madeiras... agora, um trio de rock é
banda?
Sérgio Fortes interveio:
-Tudo virou banda, baseado naquele
ditado: “O que abanda não prejudica”.
Mark Twain afirmava que o trocadilho
era a pior forma de humor, como ele não se achava presente, morreu em 1910,
Sérgio Fortes não se sentiu cerceado no seu direito de fazer trocadilhos. (*)
Jonas Vieira tentou esclarecer a
questão:
-É porque os americanos chamam de banda
apenas o “Jazz Band”, sopro e percussão, e chamam de orquestra as que têm isso
e mais as cordas. Isso vem de muito tempo, do jazz e outras coisas.
Modernamente, o Jazz e o Rock incorporaram isso com grupos menores, que
passaram a ser chamados de banda que, na verdade, é um pedaço de uma orquestra.
Em seguida, o Homem-Calendário concedeu
um tempo para o filho da Anna Koury enaltecer Henry Mancini. Ele avançou para
anunciar a segunda gravação a ser ouvida, quando foi interrompido pelo titular
do programa.
-Primeiramente, o calendário. -
interveio o titular do programa.
E vieram os eventos históricos; antes,
uma advertência aos leitores: alguns acontecimentos não chegaram aos ouvintes.
Foram cortados na edição, mas nós, do Biscoito Molhado, aproveitamos tudo.
Agora, sim, o Homem-Calendário.
-Jonas, eu vou ciar três fatos
históricos que estão inter-relacionados. Veja só: em 286, o imperador romano
Diocleciano concede a Maximiano o título de César; em 293, os dois nomeiam
Constâncio Cloro e Galério como Césares. Não é só isso: em 317, Crispo e
Constantino II, filhos do imperador romano Constantino I, e Licínio Júnior, filho
do imperador Licínio, recebem o título de César.
-E mais – inflou a voz o Sérgio Fortes
– Czar significa César em russo, e Kaiser, César em alemão.
-Tornar-se César era a glória. -
comentou o Jonas Vieira.
Simon Khoury, até então calado, se manifestou:
-Vocês sabiam que César, o original, o
Júlio César, disse o seguinte: “Sou homem de todas as mulheres e mulher de
todos os homens”?
-Atualmente, a glória dos Césares que
andam por aí é ser apenas mulher de todos os homens. - alfinetou o Jonas
Vieira.
O Homem-Calendário seguiu adiante:
-Em 1º de março de 1146, o Papa Eugênio
III publica novamente a sua bula “Quantum”. Você leu esta bula, Jonas?
-Eu engulo os papas sem ler a bula. -
foi a resposta imediata.
-Em 1580, o filósofo francês Michel de
Montaigne publica os livros I e II de seus “Ensaios”.
-São aqueles livros que todo o mundo
cita, mas ninguém lê. - comentou o Jonas Vieira.
-Nos meus livros “Bastidores”, eu narro
vários ensaios, mas são de teatro, nada a ver com filosofia. - manifestou-se
mais uma vez o Simon Khoury.
-1792, início do reinado de Francisco I
da Áustria.
-Mozart ainda vivia?
-Não, Simon, morreu poucos meses antes.
-Então, Serginho, para a coroação de
quem ele compôs a ópera “A Clemência de Tito”?
-Para a coroação do imperador da Boêmia,
Leopoldo II. Tratava-se de uma encomenda e Mozart não compôs no estilo italiano
como queriam, e a imperatriz chamou a ópera de “porcaria alemã”.
Satisfeita a curiosidade do Simon, ele
prosseguiu:
-Primeiro de março de 1290, é criada a
Universidade de Coimbra. Jonas, eles começaram uns 400 anos antes da gente.
Precisamente 623 anos, pois a primeira
universidade brasileira, a do Paraná, foi inaugurada em 1913.
-Essa eu não sabia: em 1493... eu
sempre chamei de Pinta; Santa Maria, Pinta e Niña, mas é La Pinta. Ela chegou
ao porto de Bayona, Espanha, de regresso da América, configurando o sucesso da
empreitada. Foram três, voltou uma e o pessoal bateu palma.
-Em 1498, Vasco da Gama chega a
Moçambique.
Agora, a voz do Sérgio Fortes se
tornava ainda mais sonora.
-Em 1565, Estácio de Sá funda a Cidade de
São Sebastião do Rio de Janeiro.
-Grande Sebastião!- exclamou o Jonas
Vieira.
-Grande Tião! - exclamou o Simon
Khoury, que é mais íntimo do santo.
-Em 1815, Napoleão Bonaparte retorna à
França depois do seu exílio na Ilha de Elba.
-Em 1845, os Estados Unidos anexaram a
República do Texas.
-Um estado pequenininho. - pilheriou o
Jonas Vieira.
-Do tamanho de Sergipe, mais ou menos. -
entrou o Sérgio Fortes também no clima de sarcasmo.
-1870, fim da Guerra do Paraguai com a
morte de Solano López.
-1894, primeiras eleições diretas para
presidente do Brasil
Além da fraude, na contagem dos votos,
sem eleitoras, pois o voto feminino só chegou ao Brasil em 1932.
-Em 1953, Josef Stalin sofre um derrame
cerebral e morre quatro dias depois.
-Não deixou saudades. - comentou o
Jonas Vieira.
Nefanda figura.
Agora, o Sérgio se mostrava
entusiasmado:
-Olha que interessante: em 1975,
lançado o Dicionário Aurélio. É da maior importância.
Sem o Aurélio, como os ouvintes
entenderiam o Jonas Vieira quando ele se diz “acachapado”; ou o Sérgio Fortes,
quando diz “sói acontecer”?
(*) Não só Marc
Twain, o Dieckmann também detesta trocadilhos infames, especialmente os do
Sergio Fortes, de quem ouve produções por tempos infinitos. Conta ele que o
indigitado tinha o hábito de falar tevelisão em vez de televisão e que pagou
caro por isso em momento de total circunspecção, para desespero de Marc Twain,
que, prevendo o desfecho, pode apresentar uma cara de samambaia da lusiana,
enquanto assistia a cena.
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