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O BISCOITO MOLHADO
Edição 5269L Data: 08 de março de 2016
FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII
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VIDA
LONGA AOS POLEMISTAS
Desde que passei a ter raciocínio lógico e
poder de conclusão, me manifesto diante das notícias dos jornais, dos registros
da história e de tudo em que noto relevância. Principalmente, na condição de
cidadão, por viver entre família e no âmbito profissional, aí então, correndo
sérios riscos.
E,
por ser assim, possuía o adjetivo de polêmico, carregado de conotação
pejorativa. Isso, de fato, me irritava sobremaneira, e me fazia um impaciente
controverso, mas sempre munido de argumentos, que julgava serem convincentes.
“-
Por que não te calas?!...” – frase jogada em cima do finado Hugo Chaves, então
Presidente da Venezuela, pelo Rei da Espanha, Juan Carlos, numa discussão entre
líderes políticos.
Neste caso, não discuto de quem é a razão, mas
penso que ambos são autoritários, pelos cargos que detinham, e pequenos, pela
ausência de recursos para um debate. Sendo assim, jamais seriam polemistas.
Quando eu chorava, pelo exílio no colégio interno,
apesar de criança, já polemizava, discordando daquela situação que me haviam
imposto. E meu pranto era uma vitória, posto que os que lá me internaram, com
lágrimas também lamentavam, quando iam me visitar.
Acho que alguns dos que me leem sabem que os
saudosos Carlos e Vagner e mais o casal Claudio e Gina, eu e Daniel fundamos o
“Sabadoido”. Era uma modestíssima versão satírica do famoso “Sabadoyle”,
reunião esta que acontecia aos sábados, na casa do importante advogado e
bibliófilo Plínio Doyle.
Nessa
reunião, havia uma ata, as regras eram rígidas, determinando que não se podia
discutir sobre política, futebol e religião, em nenhuma hipótese.
Lá,
exceto os temas já mencionados, falava-se de tudo, com muito apuro.
Predominavam os assuntos sobre o que de melhor havia na literatura, sendo que o
poeta Carlos Drummond de Andrade era um participante assíduo desses encontros.
Em
nossas reuniões, não. Valia tudo. Era uma confraria desregrada e mambembe, mas
com uma hospitalidade constante, sempre regada a whisky, rum, batida de limão,
cachaça e, para os abstêmios, coca-cola e água gelada.
Éramos
todos polêmicos, no melhor sentido. Por sermos amigos de infância, havia o
momento das recordações, o que era muito bom, porque “recordar é viver”.
Quando
o assunto era cinema, virava aula. Claudio é um compêndio e Carlos não ficava
atrás. Teatro, literatura, futebol, religião, nossas vidas e as vidas alheias
estavam sempre em pauta. A polêmica se instalava e o pau comia. Depois, era
tudo registrado, em forma de crônica, com muita propriedade, pelo Carlos.
A
famigerada política nunca deixou de ser discutida e, por atravessarmos um dos
piores e mais revoltos momentos da democracia brasileira, acabava não dando
certo, terminando com as reuniões. Aí, eu concordava com Plinio Doyle –
política não era um assunto para ali se discutir.
Tínhamos
em mente um “Sabadoido” antológico – convidaríamos ilustres como: Elio Fischberg,
Roberto Dieckmann, Sergio Fortes, Reinaldo Pinta e Borda. O Redator Carlos
Eduardo iria reproduzir o evento, no mínimo em cinco partes. E eu juro, em
falso, que ficaria caladinho, só ouvindo ...
Mas,
infelizmente, não conseguimos polemizar com a morte.
Acho
que a polêmica, se bem fundamentada, vem à luz. Eu sempre polemizei, nunca
arrumei subterfúgios para evitá-la. Divergir, opor-se e controverter é salutar,
quando se tem critérios éticos, mantendo a discussão em nível elevado, jamais
querendo que suas ideias prevaleçam por caminhos que possam gerar hostilidade.
Lembro-me
que ainda muito jovem, com uns dezoito anos, entrei em um debate com um senhor
classificado como idoso, pois fazia questão de dizer que já passara dos
sessenta.
Debatia-se
sobre eutanásia, assunto que até hoje
não está definido, pela complexidade que apresenta.
Em
dado momento, concluímos que não tínhamos base suficiente para uma opinião
definitiva. Foi então que o sexagenário, usando a prerrogativa de ser mais
velho, reivindicava a razão para ele. Então, em defesa das minhas teses,
incorretas como as dele, disse que diante do exposto, vencia eu, já que, sobre
o tema, faltavam-nos mais conhecimentos, só que eu desconhecia há quase duas
décadas e ele há mais de meio século ...
Que
bom seria ver, nos plenários, nos tribunais e até nas malfadadas reuniões
condominiais, polêmicas que resultassem em novas leis, que se adequassem à
realidade atual, em detrimento das arcaicas e ineficazes, que estão se
perpetuando.
Que
a Justiça se encarregasse apenas de coisas que lhe dissessem respeito, desocupando
magistrados de resolver banalidades.
E
as polêmicas escolhas dos síndicos, guardadas as devidas proporções, tivessem
semelhança com a eleição de um governador.
"Nossas vidas e as vidas alheias estavam sempre em pauta. A polêmica se instalava e o pau comia. Depois, era tudo registrado, em forma de crônica, com muita propriedade, pelo Carlos."
ResponderExcluirMenos, Batista, menos! Sem querer polemizar com o polemista autor, até pode ser verdade que depois era tudo registrado pelo Carlos, mas só talvez em algum BC (Biscoito Confidencial). Na edição final do BM só era publicada mesmo uma pequena parte, pois se não o bairro iria virar um palco de guerra, tamanha as inconfidencias cachambianas alí (des)tratadas. Sem contar que o autor polemista embora nunca tenha entrado num confessionario, era confidentes de 99% das mulheres da rua (casadas & solteiras), mas esses segredos nem o BC tem registro, mas que ainda possam inspirar belas crônicas luca/rodrigonianas, do estilo "a vida como ela é", sem citar nomes, é claro, pois como disse o Nelson "- O marido não deve ser o último a saber. O marido não deve saber nunca"
"E eu juro, em falso, que ficaria caladinho, só ouvindo ...
ResponderExcluirMas, infelizmente, não conseguimos polemizar com a morte."
"Eleição de síndico" a parte, esse polemista cronista está cada dia mais cada dia, cada vez mais, sem qualquer mácula de suspeição.