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O BISCOITO MOLHADO
Edição
5274SX Data: 14 de junho de 2016
FUNDADOR:
CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII
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O Anão da Kombi
Dizia minha avó:
"Não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe!" Demorou,
mas pude comprovar, mais uma vez, que Dona Zélia, como sempre, tinha razão.
Aconteceu na casa do Dieckmann, numa reunião
do "Clube do Bondinho", encontro de colecionadores de carros antigos promovido
nas noites de segunda-feira. Pela enésima vez me fora solicitado contar a história
do "Anão da Kombi". Relato inevitável, diante da presença de
algum novato, ou visita de um colecionador de fora. Ou repetida simplesmente
por estar há muito ausente do "hit parade", ainda que exaustivamente
conhecida de todo mundo.
Disciplinadamente, com paciência superior à de
Jó, comecei a contar a história. que, imagino, pode ser do interesse dos
leitores do seu "O Biscoito Molhado ".
É preciso retroceder muitos anos no tempo.
Estava eu com meu fusquinha 68, azul médio, na Rua Bambina, quase esquina de São
Clemente, instalando um Motorádio no dito cujo. Havia ali uma quantidade de
lojas de auto-peças, hoje desaparecidas. A cada mês o Volkswagen ganhava acessórios
que me faziam transbordar de orgulho: botões pretos para o painel, rodas aro
13, volante Fórmula 1...O carro, definitivamente, estava ficando campeão...
Pacientemente, eu acompanhava a instalação de
dois alto-falantes embaixo do banco traseiro. Com o que, eu acreditava, meu veículo
iria desbancar a mesa de som do "Le Bateau".
De repente, não mais que de repente, a Bambina
é tomada por um barulho ensurdecedor. Um fusca "brabo" com descarga
aberta ? Quem sabe alguém conhecido...Nada disso. Quem se aproxima em alta
velocidade, mas incapaz de andar em linha reta, é uma kombi! Depois de uma
freada assustadora, ela sobe, sem cerimônia, a calçada onde estou a
paparicar o meu fusca. Estou preparado para conhecer o intrépido piloto da
kombi. Alguém que conheço? Frequentador do "Postinho" ? Quem será ?
Abre-se a porta do pão de forma e dele desce, com razoável malabarismo, um anão!
Em segundos constatei que o sujeito era super
conhecido no pedaço. Dava ordens, sacaneava uns e outros, implicava com a cara
de todo mundo...
Eu permanecia encucado. Como é que aquele
sujeito, do alto do seu metro e vinte, guiava aquela kombi com tal
desenvoltura ? Aproveitei a distração geral para me aproximar do bólido, que
ainda tinha a porta entreaberta. Matei a charada: os pedais da kombi estavam
calçados com imponentes tocos de madeira. Altos o suficiente para viabilizar o
sapateado do intrépido piloto.
Visitei as lojas da Bambina em outras
oportunidades, mas nunca mais encontrei o anão da kombi. Em alguma reunião
remota do "Clube do Bondinho" tive a má ideia de contar essa história.
Fez um sucesso danado mas foi ouvida com evidente desconfiança. Pior de tudo,
fui condenado a repeti-la dezenas de vezes nos últimos trinta anos.
E recentemente, para agravar a situação, o
Dieckmann, Comodoro do Clube, baixou um regulamento: a partir das dez da noite,
os participantes da reunião estavam liberados para mentir à vontade. Pois foi
justamente no ano da graça de 2014 que fui salvo pelo gongo. Estava eu a
repetir minha narrativa pela centésima vez, quando Carlos Alberto Torres,
proprietário de belos automóveis e que não é o capitão da copa, mas um querido
amigo de todos nós, deu um pulo interrompendo o meu relato: "É o Djalma! É o Djalma!".
Silêncio absoluto. Como é que pode, o Carlos
Alberto, frequentador assíduo e antigo do Clube, nunca ter ouvido a minha história,
contada em pelo menos 150 edições ? Carlos Alberto toma a palavra e passa uma
hora falando sobre o Djalma, amigo de infância, vizinho de Botafogo e dono
da loja da Rua Bambina. Insuperável piloto de kombis...
Fui tomado de um alívio incrível. Estava
liberado de repetir a história do anão da kombi até o juízo final...Mas fiquei
preocupado logo em seguida. Minha preciosa história caíra na vala comum...
Vou resolver esse problema. Numa próxima reunião
do "Bonde" vou contar a história da menininha que instalou um motor
de Galaxie numa Leonette.
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