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quinta-feira, 24 de março de 2016

3023 - L Vou voltar, sei que ainda vou


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5272L                            Data: 24 de março de 2016

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII

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“QUEM CANTA SEUS MALES ESPANTA”

“A música popular me envolve,na medida
de tensões e emoçõesque me acontecem,
sejamsentimentais, sociais ou mesmo obscuras.
E então canto porque me encanto,
canto em qualquer canto e canto, por enquanto...” ...

Tem dias que a gente sente que alguma coisa precisa ou está para acontecer. Não é pressentimento, é o curso dos fatos; a voz é passiva, desenham nosso destino; é a “Roda Viva”.
Vento do mar no meu rosto vem do lazer gratuito que a Natureza nos proporciona.É tudo o que se tem, sem tributo, sem ônus. A calçada cheia de gente, em um ir e vir, parecendo bailar na “Valsa de uma Cidade”.
Meu coração, não sei porque fica fora do ritmo e não bate feliz. Ressente, e o que nele era poético, passa a ficar turvo. Perde a inspiração e deixa de ser “Carinhoso”.
O homem que diz: - dou, não dá, e todos me disseram isto e aquilo e todos acusaram todos e todos me enganaram. Coitado de mim, que caí no traidor “Canto de Ossanha”.
Os sonhos mais lindos, sonhei. Sonhei que as coisas se arrumariam e que dias melhores viriam. Muitos também sonharam, mas viram seus dias se acabarem. E dou conta de que meus dias, meses e anos também estão indo. E, como bobo, vivo numa eterna “Fascinação”.
Se a gente lembra, só por lembrar, que, nesta terra, tudo o que se planta,dá; que filho teu não foge à luta, pode-se perceber com imensa tristeza, que se trata de pura retórica, pois tudo amarga        Qui nem jiló”.
Por tanto amor, por tanta emoção, me engajei, me filiei, fiz campanha, rompi com teorias caducas, numa esperança sem fim. Hoje me contenho, vivo a um passo do extremo, penso duas vezes e, usando bom senso, sou”Caçador de mim”.
Quem acha, vive se perdendo. É assim que me encontro, nesse desgoverno e nas opções que me oferecem. Então, clamo para que os que estão dentro saiam, e os que estão fora não entrem. Faço isso em “Feitio de oração”.
Vidas que se acabam a sorrir, porque as lágrimas já secaram, no lamentar perdido das ilusões. Sigo em frente, tateando por caminhos escuros, diante de poderosos iluminados por “Luzes da Ribalta”.
Vai, vai, vai começar a brincadeira, há políticos no poder a vida inteira, com discursos demagógicos; há projetos fundamentados em asneiras; há mágicos que somem com tudo. Nas esquinas, o povo faz malabarismos e, no dia a dia, anda na corda bamba. Os dirigentes fazem desse país uma verdadeira gandaia, uma orgia só, uma baderna sem limites, enfim, O Circo.
É pau, é pedra, o que vejo nos embates de rua, numa luta feroz. Os que se antagonizam, empunham mastros sem bandeiras, têm os ideais iguais, as mesmas arrogâncias, iras e inocências. Para esfriar nossos ânimos, que venham logo e que nos lavemos nas Águas de Março”.
Caminhando contra o vento, contra toda adversidade, na surdina ou ao megafone, com punhos erguidos ou algemados, vou à cata de alguma “Alegria, alegria”.
Não me iludo, tudo permanecerá nessa desordem, bem organizada por combinações espúrias, jogando-nos uns contra os outros, num litígio sem fim. Espero que surjam novas formas pacíficas de convivência, transformando e ensinando o que há de melhor. E que apareça um novo “Tempo rei”.
Prepare seu coração pras coisas que se vislumbram para breve. As propostas que se oferecem são amargas como fel e os vírus que pululam, desafiam os pesquisadores, com salários irrisórios, mas por seus bons princípios, não fogem em “Disparada”.
Quando o muro separa, uma ponte une – deve ser este o sentimento a prevalecer. Não se suportam mais a omissão, o descaso, o desrespeito de uma liderança ignóbil, que nos deixam em um eterno “Pesadelo”.
Sou brasileiro, de estatura mediana, mas desde criança padeço com falsas promessas. Vi gente de botas e bombachas e a seguir me serviram um café frio; chegou um doutor com estetoscópio no pescoço e até com vassoura na mão vieram, ele e Eloá; bebendo amargo chimarrão, e dos pampas veio mais um. De um dia para outro, aquartelaram-se muitos, com muitas armas e por muito tempo. Houve quem chegasse cheio de planos e me mandasse fiscalizar; com pose de caçador, o posudo que caçou o que era meu; depois, apareceu outro, por acaso. Agora, imagine um mestre, com porte de príncipe, dizer que o que havia escrito estava completamente errado... E, como desgraça pouca é bobagem, em uma onda de paz e amor, conheci o horror – com enorme decepção vi se desprender do peito uma estrela “de-cadente”. Estou farto de”Lero, lero”.
Podem me prender, não vou parar de cantar. Gritar gol não me alivia, torço contra, porque as vitórias no futebol não mudam meu país. Não tem jeito, de jeito nenhum e eu não mudo de “Opinião”.
Quando eu soltar a minha voz, por favor, me entendam, me escutem, não deixem que me calem. É preciso mudar. É hora de estancar o que ferve em nossos corações, que vivem”Sangrando”.
Ouviram?(...)

Leiam, a seguir, os autores acima citados:



AUTORES CITADOS

RODA VIVA - CHICO BUARQUE
VALSA DE UMA CIDADE - ANTONIO MARIA
CARINHOSO -PIXINGUINHA / JOÃO DE BARRO
CANTO DE OSSANHA -BADEN POWELL / VINICIUS DE MORAES
FASCINAÇÃO- F. D. MARCHETT I/ M.D.FERAUDY / versão: ARMANDO LOUZADA
QUI NEM JILÓ - LUIZ GONZAGA / HUMBERTO TEIXEIRA
CAÇADOR DE MIM - MILTON NASCIMENTO
FEITIO DE ORAÇÃO - VADICO / NOEL ROSA
LUZES DA RIBALTA - CHARLES CHAPLIN / versão: FRANCISCO PETRÔNIO
O CIRCO - SIDNEY MILLER
ÁGUAS DE MARÇO – TOM JOBIM
ALEGRIA, ALEGRIA - CAETANO VELOSO
TEMPO REI - GILBERTO GIL
DISPARADA - THEO DE BARROS / GERALDO VANDRÉ
PESADELO - MAURICIO TAPAJÓS / PAULO CESAR PINHEIRO
LERO – LERO - EDU LOBO
OPINIÃO - ZÉ KETI

SANGRANDO - GONZAGUINHA

terça-feira, 15 de março de 2016

3022 - SX o filho fura a fila


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5271SX                               Data: 16 de março de 2016

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII

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Finalmente Florença!

Muitos anos se passaram até que eu refizesse o roteiro que meu pai, o barítono Paulo Fortes, cumpriu em 1954. Em 2013, eu e Beth visitamos, enfim, a Florença sempre mencionada em suas conversas.


O relógio marcava 6 horas da manhã quando nosso trem parou na plataforma da estação de Florença. Doze horas de viagem, desde Viena.  Cansativa e desconfortável, por nossa culpa, devo dizer. Beth e eu conseguimos transformar uma cabine ampla (e caríssima!) , planejada para propiciar aos seus ocupantes uma noite de sono repousante, num mafuá de malas e sacolas de compras. Lembro a expressão do oficial encarregado do nosso vagão, quando se prontificou a montar a cama gigante que ocupava nosso latifúndio. "Impossibile!" foi a primeira palavra que proferi na língua italiana. Nossa bagagem ocupava toda a cabine. Permanecemos a noite inteira sentados, lamentando os exageros que havíamos cometido em Londres, Berlim, Praga, Salzburgo e Viena.
A tarefa, agora, era conseguir um táxi. Tentando disfarçar que o certo, mesmo, seria contratar um caminhão. Nossa vítima não demorou a aparecer:
" Hotel Paris ! Via dei Banchi 2 ! ". Bingo ! eu havia
proferido minha segunda expressão em italiano. O motorista não disfarçou achar uma idiotice eu fornecer o endereço do hotel. Até porque a distância percorrida entre a estação ferroviária e a portaria do mesmo não passava de uns cinco quarteirões. Isso, com juros e correção monetária. Nas andanças dos dias posteriores descobrimos que, descontada a sagacidade do motorista, essa distância era ainda menor.


Seis e meia da manhã do dia 10 de maio de 2013. Atrapalhamos o sono do recepcionista do Hotel Paris, que se vingou informando que, por uma deferência muito especial, poderíamos ter acesso ao nosso apartamento a partir das 10 horas.
Muito antigo o tal Hotel Paris. Para chegar ao nosso quarto a prescrição era tomar o elevador, apertar o quarto andar e descer meio lance de escadas. Para chegar ao café da manhã, pressionar o térreo e subir outro meio lance de escadas. Leonardo da Vinci não participou daquele projeto.


O recepcionista ficou de saco cheio de ver aquele casal de brasileiros ocupando a recepção do hotel e decidiu liberar nosso quarto às 9:30.
Quarto antiguinho, meio barro, meio tijolo. Muito grande, o que causava um tremendo problema. Para se assistir sua mínima televisão, instalada numa das extremidades do recinto, impunha-se ficar de pé diante dela. Era o que eu fazia. Uma profusão de importantes jogos decisivos de vários torneios europeus, sempre transmitidos à noite, levavam a Beth ao desespero.


Chegamos ao tal quarto mortos de cansaço, merecedores de um sono reconfortante. Mas eu levara décadas para conhecer, finalmente, a Florença que tanto encantava meu pai. Não havia um minuto a perder, até porque eu estava informado de que nosso hotel estava "colado" a grandes atrações do centro histórico de Florença.
Dito e feito. Uma caminhada de não mais do que três quarteirões e estamos diante do "Duomo". Da "Porta do Paraíso". Do "Campanille de Geotto". Lembrei-me das cartas de meu pai, que guardo há quarenta anos, onde ele descrevia essas maravilhas.
A praça fervilhava de gente. Os bares e restaurantes estavam super-lotados. De repente, num bar muito simpático, fica vaga uma mesa bem em frente ao "Duomo". Poucas vezes tomei uma cerveja com tamanha sensação de merecê-la até a última gota.


Dia 11 de maio de 2013. Chegamos ao ponto culminante de nossa viagem. Dia em que eu e Beth combinamos refazer os roteiros de Paulo Fortes. Em especial conhecer a " Pensione Argentina ", onde ele se hospedou durante todo o período em que cantou em Florença. E conhecer o Teatro Comunale, palco de suas apresentações na cidade.
Consultamos o mapa. A conclusão foi a de que a "Pensione" não ficava muito perto. Decidimos ir a pé. Tomando como referência o rio Arno.
Foi, realmente, uma boa caminhada. Deixamos para trás a agitação do centro histórico e, à medida em que caminhávamos, encontramos uma cidade progressivamente mais calma, mais deserta. Pergunta daqui, pergunta dali, chegamos finalmente à Via Curtatone 12.
A "Pensione Argentina" havia sido promovida a Hotel Argentina". Dos papéis amarelados das cartas de Paulo Fortes consta o telefone 25-408. Não me animei a fazer essa ligação.
O prédio, externamente, até que é bacana, imponente. No interior o que se vê é um hotel simples, aparentemente decorado com objetos comprados na feira de antiguidades da Praça XV. A promoção de "Pensione" a "Hotel", tudo indica, não resultou em "up grade" nas instalações do estabelecimento. Olhando em volta, descubro uma placa que atesta ser o Hotel Argentina um três estrelas. Mesma pontuação do nosso  Hotel Paris. Fica claro que rola um "pixuleco" na Secretaria de Turismo de Florença.
O recepcionista do hotel tinha alguma coisa a ver com o Jim Carey. Pareceu-me tão aloprado quanto. No meu italiano de quinta categoria tentei explicar o motivo de minha visita: "Meu pai, um barítono brasiliano, cantou várias óperas em Florença, no século passado. Durante esse período, aqui permaneceu hospedado...". Jim Carey, aflito, explicou que o hotel havia mudado de dono, cerca de oito anos atrás, Achei que seria didático mostrar para o sujeito algumas cartas de meu pai, em papel timbrado da "Pensione". Junto a esse dossiê, uma foto de Paulo Fortes, com a vestimenta de "Il Cadi Inganato", de Gluck, distribuída em 1954 pelo Teatro Comunale. Jim Carey examinou a foto com atenção e comentou: "Esse senhor não tem aparecido por aqui ultimamente...
Beth não gostou do que eu disse para o sujeito:
"Graças a Deus..."


Cumprida a etapa de conhecer a "Pensione Argentina", nosso destino seguinte era o Teatro Comunale de Florença. Sua inauguração aconteceu em 17 de maio de 1862. Era conhecido como Politeama Fiorentino Vittorio Emanuele. Nele se acomodavam 6 mil pessoas sentadas (!). O teatro pegou fogo, tendo sido reaberto em 1864. Ganhou um teto em 1882. Em 1911 nele foram instalados aquecimento e eletricidade. Em 1930 foi estatizado e passou a se chamar " Comunale ". Nos dias de hoje é mais conhecido como "Teatro del Maggio Musicale Fiorentino". Esse festival confere ao Comunale posição de destaque entre os palcos mundiais da música clássica.


A distância que separa a "Pensione Argentina" do Teatro Comunale me fez entender a opção de meu pai por um hotel meia-bomba. Dois quarteirões, se tanto. Esperto esse tal de Paulo Fortes... Sempre lembrando, além disso, que ele não cogitava gastar sua escassa verba de viagem com luxos ou futilidades.
Chegamos ao Comunale pela porta dos fundos. E nos deparamos com uma tremenda agitação. Dezenas de pessoas empunhavam faixas e cartazes, protestando contra a administração do teatro. Reclamavam da falta de verbas para a cultura, dos baixos salários, da programação incipiente do teatro. Nada diferente do que sempre ouvi meu pai comentar a respeito do Municipal do Rio, ao longo de meio século de carreira. Tracei imediatamente um paralelo entre aquela agitação e as mazelas da Orquestra Sinfônica Brasileira. Eu estava completando quatro anos na Direção Executiva da Orquestra. repletos de tensões e grandes aborrecimentos.
Rapidamente cheguei à conclusão de que em Florença ou em Pindorama tudo deve ser muito parecido. Aqui é grande a quantidade de empresários, financistas, gente ligada a governos ou coisa que o valha, dispostos a assumir cargos em instituições culturais. dispostos a salvá-las da morte certa. Do caos administrativo. Da bancarrota inexorável. Farão isso concedendo-lhes minutos do seu preciosíssimo tempo. Prontos a contribuir com sugestões geniais que, no dia a dia do mundo dos negócios, são avaliadas a peso de ouro.  
Seu desprendimento é comovente. Agarram-se a esses cargos durante anos a fio. Não entendem de arte, muito menos de música ou de músicos. Mas querem colaborar com essas causas nobres a custo zero. Comove poder contar com tanta sabedoria, com tanta proficiência.
Injusto lembrar sua capacidade de cometer as maiores lambanças, arrumar terríveis confusões. Tudo em nome da cultura. Em nome da arte.


Contornamos o grupo de manifestantes à procura de uma porta que desse acesso ao Comunale. A portinha dos fundos, a entrada dos artistas, que deve existir em todos os teatros do mundo. Seja no Colon de Buenos Aires, no Metropolitan de Nova Iorque, no Comunale... Certamente, todas são muito parecidas. Pela do Municipal do Rio devo ter passado mais de mil vezes...
Na recepção do Comunale está sentado um cidadão que não é exatamente um campeão de simpatia. Conto minha historinha, no meu italiano impublicável: "Mio padre... un barítono brasiliano... ha cantato in questo teatro..."
Com falta de saco total, o tal sujeito pelo menos me deixou falar. Mas deu a conversa por encerrada com a informação : "daqui a pouco vai começar o ensaio geral da orquestra. A entrada não é permitida. Impossível visitar o teatro nesse momento "
Saímos desanimados cruzando com nossos manifestantes. Decidi tentar uma última cartada. Dirigi-me a um grupo que me pareceu simpático, indagando se haveria uma hora própria para visitar o teatro. Afinal, "Mio padre... Barítono brasiliano..." Deu certo! Meus agitadores eram músicos da orquestra do Teatro Comunale. Braziliani? Estivemos no Rio de Janeiro no ano passado e tocamos naquele belíssimo teatro que fica perto do mar...Teatro Municipal? ... É esse mesmo!..." "Seu pai cantou aqui no Comunale? Ele era do coro?"
Eu havia chegado perto do gol. E o goleiro saíra para lanchar. "Meu pai cantou primeiros papéis! Cantou óperas muito especiais, entre as quais tal, tal e tal... Foi regido pelos Maestros Franco Ghione, Bruno Bartoletti, Vittorio Gui... Finalmente, corri para a torcida sacando do meu envelope as fotos publicitárias do Comunale, com Paolo Fortes (das fotos consta Paolo, e não Paulo) devidamente paramentado para cantar "Il Conte Ory", "La Fata Malerba", "La Granceola" e por aí vai.
Gelo quebrado, os músicos indagam: "Mas o que vocês querem ? Conhecer o teatro ? Isso não é problema. É só entrar com a gente. Daqui a minutos temos ensaio com o Maestro Zubin Mehta para o concerto de domingo. Vamos abrir um camarote para vocês.”
O antipático da portaria viu-se na contingência de fornecer ao grupo a chave do camarote. Assistimos, emocionados, o grande Zubin Mehta ensaiar a orquestra do Comunale na "Sagração da Primavera". Cinquenta e nove anos depois da estreia de meu pai em Florença, eu conhecia o teatro em que ele alcançara marcos importantes de sua trajetória artística.



3021 - L pau que bate em Pedro Penha, Maria Paulo


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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5270L                                Data: 15 de março de 2016

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII

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 “ DURA LEX SED LEX “ (quisera fosse...)

Das leis, tanto já ouvi, que falar de todas, em especial das bizarras, iria ocupar muitas laudas. Vigentes, são mais de cem mil, no Brasil. Vou me ater a algumas, que são usadas e que levam o nome de seus autores.
E também para encontrar correlação com o Barão Montesquieu, que, talvez para que ficassem melhores seus pensamentos, desfez-se do título.
Montesquieu viveu lá pelos idos de 1700. Teve um profícuo relacionamento com as leis. Melhor seria eu continuar com essa eminente celebridade, mas os fatos atropelam a ordem do texto.
Sobre a “Lei Pelé”, que normatiza e organiza o Desporto, dizem ser idêntica à “Lei Zico”, só muda a forma redacional. Distintos aí, só o Zico, a Norma e o Pelé.
Volto a Montesquieu, que escreveu um livro que se tornou referência mundial na área do Direito, servindo de forma abrangente a advogados, magistrados, cientistas sociais, legisladores e, por mero diletantismo, a esse intruso escrevinhador.
Dando asas à desordem das ideias, lembro que, por causa do Decreto Nº 5.213, de 21/01/1943, de Getúlio Vargas, fundamentado pelo famosíssimo jurista Nelson Hungria, decreto esse que ficou conhecido como “Lei Teresoca”, Vargas, ditador e Hungria, Juiz de Direito à época, promulgaram esta norma, no interesse exclusivo do jornalista Assis Chateaubriand, dando-lhe direito de posse, guarda e responsabilidade sobre uma filha, vinda de relacionamento extraconjugal e a quem ele se recusara a lhe dar o próprio nome.
A mãe da menina, uma jovem de apenas quinze anos, desinteressou-se do velho Assis e ele recorreu àqueles amigos ilustres, deixando a moça ainda ligada a ele.
Montesquieu neles!
“ A lei deriva da natureza das coisas e não da vontade ou do arbítrio de qualquer um”. Bonito, não ?
A Lei Afonso Arinos, cujo autor, felizmente, não tem nada a ver com arianos, foi criada para coibir o preconceito racial, já passa de sessenta anos de vigência e é descumprida até hoje. Apesar de o IBGE já divulgar que existem mais negros e pardos do que brancos, lamentavelmente, o preconceito continua. Feio, não ?
Há mais de duzentos e cinquenta anos, Montesquieu cunhou essa: “Uma coisa não é justa porque é lei, mas deve ser lei porque é justa”. Perfeito, não?
Como já disse, leis que levam nomes próprios, pontificam nesta crônica; então, vamos para uma das leis mais recorrentes atualmente: a “Lei Maria da Penha”, denominação popular da Lei Nº 11.340, criada para impor mais rigor penal, aumentando a punição sobre os crimes de violência doméstica. É normalmente aplicada a homens que agridem mulheres, física e psicologicamente.
Procurei em Montesquieu algum pensamento que se aplicasse a esse tão corriqueiro e grave delito e encontrei esse: “A liberdade é um bem tão apreciado, que queremos ser donos até da alheia”. Acertou na mosca, não?
Daqui a pouco, vão criar a “Lei Pedro Paulo”, que, combinada com a “Lei Maria da Penha”, se desdobrará nas Leis Pedro Penha e Paulo Maria, e que, quando for necessário, custe o que custar e doa em quem tiver doído, tudo apagarão, mesmo as marcas deixadas, até então indeléveis. Quanto a isso, não encontrei nada em Montesquieu que aludisse a tal despautério.
O livro a que me referi no início e que até hoje dá norte a quem entende e concorda com Montesquieu, quando disse que “Liberdade é fazer tudo o que a lei permite”, chama-se “O ESPÍRITO DAS LEIS”, obra que inspirou a ”Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão na Revolução Francesa”.
A quem se interessar, são só vinte e sete volumes. E boa leitura  !...





terça-feira, 8 de março de 2016

3020 - Eleição de síndico



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O BISCOITO MOLHADO

Edição 5269L                                Data: 08 de março de 2016

FUNDADOR: CARLOS EDUARDO NASCIMENTO - ANO: XXXIII

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VIDA LONGA AOS POLEMISTAS
 Desde que passei a ter raciocínio lógico e poder de conclusão, me manifesto diante das notícias dos jornais, dos registros da história e de tudo em que noto relevância. Principalmente, na condição de cidadão, por viver entre família e no âmbito profissional, aí então, correndo sérios riscos.
E, por ser assim, possuía o adjetivo de polêmico, carregado de conotação pejorativa. Isso, de fato, me irritava sobremaneira, e me fazia um impaciente controverso, mas sempre munido de argumentos, que julgava serem convincentes.
“- Por que não te calas?!...” – frase jogada em cima do finado Hugo Chaves, então Presidente da Venezuela, pelo Rei da Espanha, Juan Carlos, numa discussão entre líderes políticos.
 Neste caso, não discuto de quem é a razão, mas penso que ambos são autoritários, pelos cargos que detinham, e pequenos, pela ausência de recursos para um debate. Sendo assim, jamais seriam polemistas.
 Quando eu chorava, pelo exílio no colégio interno, apesar de criança, já polemizava, discordando daquela situação que me haviam imposto. E meu pranto era uma vitória, posto que os que lá me internaram, com lágrimas também lamentavam, quando iam me visitar.
 Acho que alguns dos que me leem sabem que os saudosos Carlos e Vagner e mais o casal Claudio e Gina, eu e Daniel fundamos o “Sabadoido”. Era uma modestíssima versão satírica do famoso “Sabadoyle”, reunião esta que acontecia aos sábados, na casa do importante advogado e bibliófilo Plínio Doyle.
Nessa reunião, havia uma ata, as regras eram rígidas, determinando que não se podia discutir sobre política, futebol e religião, em nenhuma hipótese.
Lá, exceto os temas já mencionados, falava-se de tudo, com muito apuro. Predominavam os assuntos sobre o que de melhor havia na literatura, sendo que o poeta Carlos Drummond de Andrade era um participante assíduo desses encontros.
Em nossas reuniões, não. Valia tudo. Era uma confraria desregrada e mambembe, mas com uma hospitalidade constante, sempre regada a whisky, rum, batida de limão, cachaça e, para os abstêmios, coca-cola e água gelada.
Éramos todos polêmicos, no melhor sentido. Por sermos amigos de infância, havia o momento das recordações, o que era muito bom, porque “recordar é viver”.
Quando o assunto era cinema, virava aula. Claudio é um compêndio e Carlos não ficava atrás. Teatro, literatura, futebol, religião, nossas vidas e as vidas alheias estavam sempre em pauta. A polêmica se instalava e o pau comia. Depois, era tudo registrado, em forma de crônica, com muita propriedade, pelo Carlos.
A famigerada política nunca deixou de ser discutida e, por atravessarmos um dos piores e mais revoltos momentos da democracia brasileira, acabava não dando certo, terminando com as reuniões. Aí, eu concordava com Plinio Doyle – política não era um assunto para ali se discutir.
Tínhamos em mente um “Sabadoido” antológico – convidaríamos ilustres como: Elio Fischberg, Roberto Dieckmann, Sergio Fortes, Reinaldo Pinta e Borda. O Redator Carlos Eduardo iria reproduzir o evento, no mínimo em cinco partes. E eu juro, em falso, que ficaria caladinho, só ouvindo ...
Mas, infelizmente, não conseguimos polemizar com a morte.
Acho que a polêmica, se bem fundamentada, vem à luz. Eu sempre polemizei, nunca arrumei subterfúgios para evitá-la. Divergir, opor-se e controverter é salutar, quando se tem critérios éticos, mantendo a discussão em nível elevado, jamais querendo que suas ideias prevaleçam por caminhos que possam gerar hostilidade.
Lembro-me que ainda muito jovem, com uns dezoito anos, entrei em um debate com um senhor classificado como idoso, pois fazia questão de dizer que já passara dos sessenta.
Debatia-se sobre eutanásia, assunto que até hoje não está definido, pela complexidade que apresenta.
Em dado momento, concluímos que não tínhamos base suficiente para uma opinião definitiva. Foi então que o sexagenário, usando a prerrogativa de ser mais velho, reivindicava a razão para ele. Então, em defesa das minhas teses, incorretas como as dele, disse que diante do exposto, vencia eu, já que, sobre o tema, faltavam-nos mais conhecimentos, só que eu desconhecia há quase duas décadas e ele há mais de meio século ...
Que bom seria ver, nos plenários, nos tribunais e até nas malfadadas reuniões condominiais, polêmicas que resultassem em novas leis, que se adequassem à realidade atual, em detrimento das arcaicas e ineficazes, que estão se perpetuando.
Que a Justiça se encarregasse apenas de coisas que lhe dissessem respeito, desocupando magistrados de resolver banalidades.
E as polêmicas escolhas dos síndicos, guardadas as devidas proporções, tivessem semelhança com a eleição de um governador.